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Comportamento

“Dó de desmanchar”, diz Dolvino que não vende casa de madeira por nada

Feita em 1965, estrutura simples é lar do aposentado que guarda memórias da ex-esposa e infância das filhas

Jéssica Fernandes | 19/10/2022 06:05
Desde 1965, Dolvino vive na casa de madeira no Bairro Monte Castelo. (Foto: Kísie Ainoã)
Desde 1965, Dolvino vive na casa de madeira no Bairro Monte Castelo. (Foto: Kísie Ainoã)

Construída em 1965, a casa de madeira antiga e bastante simples destoa das demais de alvenaria que povoam o Bairro Monte Castelo. Propriedade do eletricista aposentado Dolvino Ferreira de Queiroz, de 74 anos, o imóvel não tem preço. “A gente tem dó de desmanchar. Não é que você se apega nas coisas velhas, mas é que você não quer se desfazer”, afirma o morador.

Feita com peroba, a casa tem metade coberta por telha pvc e eternit. O espaço não é amplo e possui quatro cômodos que suprem as necessidades do morador. Para sair da sala em direção a cozinha ou os dois quartos não é preciso dar mais de cinco passos. Já o banheiro foi construído à parte, nos fundos.

Dolvino fez algumas das tábuas de madeiras virarem agenda onde anotou telefones, nomes e recados. Nelas, é possível ver o pouco da tinta amarela que antes dava cor ao que hoje é predominado pelo marrom. Do chão de puro concreto, sem pisos ou revestimento até o teto não são mais de dois metros, contudo isso também não é problema para Dolvino.

Sala dispõe de poucos móveis e divide espaço com pneus. (Foto: Kísie Ainoã)
Sala dispõe de poucos móveis e divide espaço com pneus. (Foto: Kísie Ainoã)

Apesar da chuva de terça-feira (18), que fez muitos moradores manterem as portas das casas fechadas, o aposentado manteve a sua bem aberta. É quase 16h e é possível ver da rua Dolvino na sala assistindo televisão. Quando vê que tem visita, ele não pensa duas vezes, convida para entrar e oferece a cadeira onde estava sentado.

“Esse aqui é a Igreja Mundial do Reino de Deus. Não é que eu sou seguidor, gosto de assistir, porque uma hora dessas não tem muita coisa que presta”, alega Dolvino sobre a programação exibida na tv.

A data de quando chegou ao local o aposentado não lembra de imediato. Primeiro diz que foi em 1973, mas depois de alguns minutos se corrige e afirma que na verdade era 1965. “Eu nunca mudei”, afirma.

Aposentado comenta sobre o falecimento da esposa. (Foto: Kísie Ainoã)
Aposentado comenta sobre o falecimento da esposa. (Foto: Kísie Ainoã)

A mudança não foi por falta de propostas, pois ele recebeu várias pelo terreno ao decorrer dos anos. Ao mencionar o assunto, o morador conta que uma vez começou a construir outra casa no quintal. “Eu tive um imprevisto, minha mulher ficou doente e morreu. Fiquei meio sem rumo e o dinheiro que tinha investi na saúde dela. Eu meio que desanimei, mas eu acho que a vida tem que continuar”, comenta.

Viúvo há seis anos, Dolvino continuou a vida, porém até hoje não concluiu as duas peças que ficam na área externa. Sem muitos móveis, o lar parece ser revestido pela mesma simplicidade que acompanha cada fala e gesto do dono.

Na sala está uma pilha de pneus que divide espaço com um pequeno banco de madeira e duas cadeiras de metais. Encostada na parede está a rack e a televisão onde o aposentado acompanha o programa religioso. A cozinha também só tem o necessário para ele que só não vive sozinho porque garante ter a companhia do casal de gatos.

Cozinha é simples e tem somente o necessário para a rotina do morador. (Foto: Kísie Ainoã)
Cozinha é simples e tem somente o necessário para a rotina do morador. (Foto: Kísie Ainoã)

Ao mencionar o que mais gosta no lar, ele cita a qualidade da vizinhança. “É um aconchego, a gente conhece todo mundo aqui, é tranquilo. As pessoas não incomodam a gente e os vizinhos são bons”, frisa. Em seguida, ele diz ser o morador mais antigo. “Não só da rua, mas da região”, esclarece.

Além de ter ‘dó de desmanchar a casa’, o aposentado guarda boas recordações do lugar onde viveu com a mulher e criou as filhas. “A lembrança melhor é de quando elas eram tudo pequenas. Eu viajava muito e quando chegava era aquela saudade das crianças e da mãe das crianças”, conta.

Natural de Três Lagoas, ele comprou a casa aos 23 anos e não sente mais vontade de mudar nada. Futuramente, ele planeja morar com uma das filhas e deixar o lar de madeira intacto. “Vou deixar meio quieto aqui”, finaliza.

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