“Gordo, peludo e barrigudo”: os desafios do personal fora do padrão
Emerson é um personal trainer fora dos padrões, conforme diz, e fala de como é capaz de trabalhar e ainda levar uma vida saudável
Gordo, baixo, peludo e barrigudo – "mas ainda sim um gato". É assim que Emerson da Mota Eloy Florian, 32 anos, se define. Personal trainer em Campo Grande, ele não tem tempo ruim quando o assunto é o próprio corpo: posta foto sem camisa mesmo sem um tanquinho definido, toma cerveja e diz que foi capaz de construir uma carreira "vendendo saúde" por meio da autoaceitação.
"Particularmente, minha barriguinha nunca foi problema, mas no profissional sim. Eu, que sou um personal completamente fora do padrão, o cliente para e pensa: 'como é que vou emagrecer com a ajuda desse cara?'. Olhos tortos e comentários com duplo sentido não faltaram", conta.
Mas Emerson diz que sempre deu a volta por cima e prova que tem autoestima no alto. "Graças a essa minha pancinha, ser um baixinho gordinho, que ganhei uma visibilidade natural, seja no real quanto no virtual, e vivo sem medo de represália", garante.
Natural de Indiaporã, no interior do estado de São Paulo, Emerson veio para Mato Grosso do Sul depois de formado. Na época em que morava com a família, era um magro de barriga "acentuada". O ganho de peso, entretanto, só veio com o passar dos anos.
"Minha dificuldade não era em me aceitar com relação ao peso, mas com a minha imagem. Tinha dentes tortos, pelos em excesso, era um baixinho de perna torta, então passei por muito bullying. Me sentia como um patinho feio e, pior, acreditava no que eles me diziam", relembra.
No final de 2010, a dona da academia em que trabalhava na sua cidade natal se mudou para Campo Grande. Recebeu, na ocasião, o convite de ser o responsável técnico. Ficou 1 ano assim. Quando o novo proprietário assumiu o espaço, o público migrou de mulheres e idosos para os mais jovens e adeptos ao "corpitcho" definido.
"Foi um desafio. Não só por eu não ter muitas experiências com a musculação, mas porque eu sentia na cara dura o julgamento dos alunos por eu não estar – muito menos buscar – um padrão musculoso. Foram anos de desconstrução para conquistar o respeito profissional e a autoaceitação que tenho hoje", considera.
"No trabalho, sempre ouvia 'professor e essa barriguinha?, 'tá barrigudinho, viu?' ou 'tem que parar de beber, começar a treinar!'. Por eu ser um profissional da educação física, as pessoas se achavam no direito de me cobrar, de criticar. Não vou negar que no começo aquilo me incomodava, tanto é que parei de adicionar alunos nas minhas redes sociais. Porém fui firme, fiz o que achava certo. Ainda bem que contei com o apoio do dono e de muitos outros parceiros. Davam a liberdade de ser quem eu sou", agradece.
Quando ele próprio veio para Campo Grande, começou uma nova vida. Se soltando mais – tanto no corpo quanto na aparência – Emerson diz que se "encontrava rindo". Inclusive sobre sua sexualidade. Desde os 14 anos revelou à família ser gay.
"Ao mesmo tempo que relaxava também criava uma personalidade 'casca dura', forte, que não tentava não ligar para o que os outros diziam. Deu certo, pois bloqueei o que seria muito sofrimento. Fiz um tratamento para corrigir meus dentes, passei a aceitar meus pêlos e até deixar a barba crescer. Ainda, fui ganhando mais barriguinha sem constrangimento", revela.
Sem timidez, inclusive, na hora de postar nas redes sociais. Seja só de sunguinha ou sem camisa no pós-treino, Emerson garante nunca ter a pretensão de se tornar "blogueirinho", como seus amigos brincam.
"Mas é que recebo muitos relatos de seguidores que dizem admirar a autoestima que tenho, minha aceitação. Muita gente tem vergonha de mostrar o corpo, na praia ou piscina, com medo das críticas. Tento falar um pouco desse processo que não é fácil, uma forma de encorajar o outro. Mas é claro, assim como os elogios, tem sempre aqueles com o prazer de criticar", ressalta.
E acrescenta: "sempre deixei claro que o que eu faço da minha vida fora do trabalho não diz respeito a ninguém. O que faço e penso representa somente a minha opinião, que também deve ser respeitada, afinal cada um tem seu tempo e individualidade".
Atualmente, Emerson é dono de uma academia no Centro da cidade, onde dá aulas de jump, step e treino funcional. "Comigo, deu certo 99% das vezes, mas sempre tinha aquele 1% que não queria ser atendido por mim, não me cumprimentava, fazia piada quando eu passava. No meu processo passei a filtrar essas pessoas, porque não valia a pena gastar um pingo de energia com elas", afirma.
Pandemia – Mesmo se sentindo seguro de si, Emerson adquiriu a covid-19 no ano passado, o que o desestabilizou. "Tive um quadro grave, fiquei no oxigênio e, passado o susto, percebi que eu não era mais o mesmo. Sentia muita falta de ar, dificuldade para subir e descer escadas, me cansava muito rápido mesmo. Ainda, não conseguia dormir direito, sentia muito cansaço".
Assim, os comentários que até então não o incomodavam passaram a ser desagrado. "Ganhei um peso considerável, perdi roupas no caminho. Passei do equilíbrio conquistado. Foi aí que prometi a mim mesmo que 2021 seria a minha saúde em primeiro lugar", assegura.
Além do treino de musculação no seu espaço, entrou para a natação, crossfit e está tendo acompanhamento nutricional. "Assim cuido também da minha alimentação, mas sem deixar a boa cerveja e o petisquinho de lado! E tá tudo bem", brinca.
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