Já são 10 anos do Lado B e de muita gente desligando caretice da tomada
“Mãe, eu tenho curiosidade de saber como é aquela casa por dentro”.
A fala da estudante Alice Lemos, de 15 anos, dita recentemente, enquanto caminhava pela Rua da Paz, endereço que abriga a sede do Campo Grande News, é a síntese de como o Lado B brotou no jornalismo sul-mato-grossense.
Neste mês, o canal que surgiu para falar de amenidades em meio ao turbilhão de notícias do maior portal do estado completa 10 anos de vida.
Lá em 2011, a jornalista Ângela Kempfer, editora-chefe deste jornal, saiu para andar na cidade ancorada na convicção de que tudo, até o vestido que restou de uma artista que nunca foi devidamente reconhecida em vida, poderia virar uma boa reportagem.
Assim, o Campo Grande News provou que uma série de acontecimentos, até então nunca vistos como notícia, são tão relevantes quanto pessoas anônimas, cheias de boas histórias para contar.
Foi assim nos 10 anos do Lado B, completados agora, em agosto, com mais de 30,6 mil reportagens publicadas. Renderiam vários livros sobre estabelecimentos abertos e fechados. Mas também sobre o comportamento do campo-grandense e suas mudanças em meio a uma década. Sobre a periferia divulgada sem colocar no bloquinho o preconceito. Sobre a diversidade e as paredes que falam tanto quanto o coração de quem vive por trás delas.
Para algumas pessoas, essas histórias da vida real do campo-grandense não só bombaram em leituras para o jornal, como formaram um arsenal de desconstrução ao longo do tempo, capaz de fazer até uma setentona entender que nos anos 2000 rejeitar “gay, sapatão e travesti” não é coisa de gente careta, mas de alma inflada pelo preconceito.
Isso é o que diz a Aguena, dona de um dos bares mais antigos na cidade na região central, na Rua Aquidauana. Há décadas, os azulejos são os mesmos, mas a cabeça dela e do marido, o Pedrão, não. Tudo mudou quando a juventude passou a dividir o espaço com a velha guarda. “Foi um milagre quando essa gurizada descobriu meu bar nos últimos 10 anos”, conta sobre a mudança.
De lá pra cá, a diversidade dominou o lugar e fez Aguena se desconstruir. “Eu fui criada de outro jeito, aprendi a vida de um modo diferente, mas com eles, eu aprendi sobre respeito, sobre preconceito, sobre o sofrimento que, principalmente, os LGBT sofrem”, conta.
A desconstrução, claro, não agradou todo mundo. “Meio Campo Grande deixou de vir no meu bar depois que a juventude começou a vir”, diz. “Mas eu não me importo. Os mais novos me animam. O jovem me ensinou que a gente pode viver com qualquer pessoa sem precisar separar ninguém”, acrescenta.
Nesses 10 anos, Aguena não se diz militante, mas garante que não baixa a crista para quem tenta menosprezar ou machucar seu público com ofensas. “Eu sabia que o preconceito existia, mas eu não tinha dimensão do sofrimento dessas pessoas quando alguém falava 'bichinha', 'veado' ou 'travesti com a navalha' só para ofender. Com o tempo, eu fui aprendendo e hoje, os defendo. Sei que o preto, o pobre e o gay não vale nada para alguns. Por isso, eu abraço e não me importo se alguém deixar de vir ao meu bar e comer o meu quibe”, finaliza a dona.
Para quem veio da periferia e cresceu no funk, fazer essa cultura deslanchar numa capital conservadora é nadar contra a corrente. Esse sempre foi o sonho do Jean Medina, conhecido como Paçoca, um dos maiores parceiros desde o início do Lado B, quando o canal decidiu mostrar também os eventos na periferia da cidade, e ele topou de cara mesmo levando bordoada em diversos momentos quando as festas acabavam no famoso “risca faca”.
“A primeira matéria que o Lado B fez sobre mim e o funk no Santo Antônio foi muito importante. Tudo o que eu mais queria era mostrar por trás dos bastidores, mostrar que o funk periferia existe que nele tem pessoas com sonhos imensos, sem essa de que a periferia é só tiro, porrada e bomba”, diz o produtor, aos 30 anos.
Cobrir arquitetura na cidade também foi sempre um grande diferencial, a chance de mostrar ao campo-grandense que imóveis sejam eles antigos ou projetos mais modernos tem suas significâncias. Com isso, foi possível valorizar ao longo dos últimos 10 anos a identidade cultural em todos os aspectos.
“Na arquitetura e design, encontramos espaço para revelar talentos com potencial nacional e internacional. A Casacor MS está desde 2009 com as mostras e percebe o interesse da equipe por traduzir esses aspectos tanto da urbanização, quanto de estilos de profissionais. Entendendo e divulgando o que temos de melhor sobre o setor no Estado. Recordo-me do interesse em entender melhor sobre o tema com coberturas exclusivas em São Paulo e Rio de Janeiro que agregam nesse entendimento. Parabéns a toda equipe do Lado B”, comenta a diretora de comunicação da mostra, Dilma Bernardes.
Por isso, quando o leitor e até nossos haters comentam sobre o interesse do Lado B em diferentes entrevistas e questionam se não há temas "mais relevantes por aí", vale dizer que o que mais conta para nós, é inspirar pessoas.
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