"Dono" do Proibidão tem só 23 anos e quem frequenta resume: “esse é nosso morro"
Jean Paçoka parece uma celebridade em dia de baile funk no bairro Santo Antônio. Não passa pelo salão sem ser abordado, beijado ou abraçado. O guri de 23 anos tem cara de menino, mas voz grossa e discurso de empresário. O primeiro contato é “a paisana”, chego como uma pessoa qualquer que quer conhecer o Empório Santo Antônio.
Mesmo sem saber que estava recebendo uma jornalista, disposta a falar verdades sobre o evento, Jean é atencioso. Abre o camarote depois de um pedido do grupo de cinco pessoas que ele nunca tinha visto antes. “Vocês vão gostar”, promete.
Há 3 anos, o rapaz resolveu investir na casa junto de um sócio, desde que o sertanejo não deu certo ali. “Peguei um público que ninguém queria. Então investi e hoje ta aí. Temos mais de 800 pessoas lá dentro dançando”, conta.
Como se fosse um MC do funk estilo “ostentação”, usa correntes, relógio e fala abertamente. ”Já consegui comprar apartamento, casa, moto”.
No início, a maior barreira para conseguir parcerias foi o preconceito. “Tinha gente que dizia que isso aqui ia ser putaria, bagunça. Mas a gente conseguiu acabar com essa imagem”, garante. Como em um placar de acidentes de trabalho, ele contabiliza 1 ano e 2 meses sem violência envolvendo a casa.
Aos sábados, outro grupo é responsável pelo funk no Empório, com vários bondes femininos com nome sugestivos como As Felinas, as Fogosas, Menininhas do Papai. Mas Jean diz que no “evento dele” não tem espaço para esse tipo de “gurizadinhas”. “Não gosto desse tipo de show. Aqui recebo empresários, gente que gosta de qualidade. Meu negócio é o som automotivo. Não tinha espaço para as equipes tocarem em Campo Grande, então convidei para virem pra cá”, lembra.
No palco, ele convoca o público entre uma música e outra: “Levanta a mão aí quem teve um amigo que a vida levou na ‘judaria’” e na sequência introduz o refrão: “Eu tô bolado, cheio de ódio no meu coração, com a judaria que fizeram com nosso irmão”. Mas ele diz que é tudo onda, jura que a casa prega a paz. “O povo vem só para dançar”, diz.
O Empório tem 10 seguranças e 20 funcionários, que cumprem uma função que, segundo Jean, é questão de honra e sobrevivência para quem vive do funk. “Há uma produção. Cuidamos desde a hora que a pessoa entra, até às 5 da manhã quando todo mundo sai. É pra não ter qualquer complicação”.
Também tem a vantagem da proximidade. Jean cresceu no bairro Santo Amaro, ao lado do Santo Antonio. Então, diz estar em casa. “Todo mundo me respeita”.
O público de Jean tem cara também de gente nova, mas todo mundo diz ter 18 anos. No topo das preferências do Proibidão, aparece o MC Magrinho, funkeiro carioca que dia desses foi indiciado porque publicou no Facebook uma foto na qual aparece com um fuzil. “Ele fala o que a gente tem vontade de falar, mas não tem coragem”, justifica o servente Ricardo Thiago, de 18 anos.
O dia mais esperando para os fãs é o 29 de agosto, quando o MC vai estar em Campo Grande em show na Chácara Tôa Tôa, outro reduto funkeiro.
Magrinho é dono do hit “Pumba La Bumba...Pumba La Bumba...Pumba La Bumba...”, com letra impublicável. Mas vale a pesquisa no Google para descobrir o conteúdo dessa pérola. Também tem canções machistas como “Tu me chama de maconheiro, eu te chamo de piranha.Te meto a porrada e você se apaixona.”
Já a turma que gosta de algo mais revoltado, curte MC Daleste, assassinado há quase dois meses com tiro durante show. “Ele morreu, mas continua na boca da gente”, comenta Jeniffer Trindade. No “recado” que ficou do MC estão músicas como “Apologia”: “Matar os polícia é a nossa meta. Fala pra nós quem é o poder. Mente criminosa, coração bandido. Sou fruto de guerras e rebeliões."
Nosso morro - Os olhos brilham quando o assunto é baile funk no Rio de Janeiro. Mas como ir até lá é difícil, a casa do funkeiros em Campo Grande parece ser o Empório Santo Antônio. “Nosso morro é aqui”, diz Tamara de Souza, menina sorridente do Jardim Aeroporto, com laço nos cabelos pintados de negro.
Na mesma roda, Luan e Gabriel contam que vieram de Terenos para o “Proibidão”. “A gente gosta de conhecer tudo. Escuto sertanejo, rock... Só não aguento chamamé porque é coisa de velho”, diz Luan.
Sobre as diferenças com as casas do Jardim dos Estados, Wesley Figueiredo jura que o “povo” do funk nunca fez discriminação. “Venho aqui como vou lá na balada sertaneja. A diferença é que aqui no bairro ninguém fica reparando em patricinha que chega. Lá, te olham como se você fosse sujo”, reclama.
Sobre violência, ele também faz comparações. “Nunca vi morte aqui. E se você for ver as ocorrências por aí, tem muito mais confusão em bar granfino da Afonso Pena”.