Livro quer acabar com crendices que colocam tamanduá em risco
Além de serem mortos devido a crenças, animais estão em terceiro lugar entre os mais atropelados em MS
Tamanduá-bandeira e gato preto têm algo em comum: são vítimas das crendices populares. É mundialmente conhecida a crença de que gato preto representa azar. No Cerrado brasileiro, o tamanduá-bandeira assume esse papel, o que resulta, muitas vezes, em mortes desses bichos. O problema, associado aos atropelamentos em rodovias, ameaça a continuidade da espécie, já inserida na lista das que estão em processo de extinção.
O assunto foi pesquisado e se tornou livro infantil, intitulado “O Incrível Tamanduá Bandeira”, e que faz parte do projeto Bandeiras e Rodovias, do ICAS (Instituto de Conservação de Animais Silvestres) em parceria com o IPÊ (Instituto de Pesquisas Ecológicas). Serão distribuídos gratuitamente cinco mil exemplares em escolas públicas de Mato Grosso do Sul.
O objetivo do livro é informar crianças e adolescentes sobre a importância desse icônico animal do Cerrado e, assim, sensibilizar esses jovens leitores (e, por extensão, todas as pessoas) quanto ao respeito à vida desses bichos.
Os organizadores informaram que o tamanduá-bandeira (Myrmecophaga tridactyla) é considerado vulnerável à extinção, constando na Lista Vermelha das Espécies (IUCN/ União Internacional para a Conservação da Natureza). Nas rodovias de Mato Grosso do Sul, é a terceira espécie que mais morre em atropelamentos, atrás apenas do cachorro-do-mato e o tatu-peba.
Mas os tamanduás não são atropeladas apenas devido a altas velocidades, mas também por serem “mal vistos” por muitas pessoas, que acreditam que esses animais atraem mau agouro. "Essas crenças acabam virando motivo de perseguição aos animais”, nota a a bióloga Mariana Catapani, doutoranda do programa de Ciências Ambientais da USP (Universidade de São Paulo) e que ajudou no levantamento de dados para o livro juntamente com Bruna Oliveira, coordenadora do Projeto Tatu Canastra Cerrado.
Em consequência das crendices, tamanduás acabam sendo mortos, segundo informa Mariana. “Há quem acredite, por exemplo, que, ao cruzar com um tamanduá, a sorte só voltará se a pessoa bater no focinho do bicho. Outros, em posse de veículos, acabam cometendo o atropelamento proposital", exemplifica.
Mariana e Bruna avaliaram as crenças populares sobre a espécie a partir de mais de 500 entrevistas na região de Cerrado do Mato Grosso do Sul. "Existem diversas questões apontadas pelos entrevistados sobre não gostar da espécie, de crenças à baixa percepção estética sobre o animal. Isso é um processo psicológico e algo que passa de geração em geração”, afirma Mariana.
A pesquisadora aposta na contribuição do projeto. “Espero que com esse livro, possamos alcançar as crianças para que elas cresçam com um olhar livre de preconceitos e desse tipo de crença que só prejudica essa espécie tão importante", finaliza.
A publicação conta também com um Manual do Professor, com atividades para serem executadas em sala de aula com os alunos, e ilustrações do biólogo Pedro Rodrigues Busana. As artes são resultados do seu mestrado profissional na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).
"Os desenhos têm uma abordagem científica baseados em observações e entrevistas com profissionais com a função de delinear o que precisaria ficar evidente nessa arte. Buscamos um traço mais realista, para que as crianças identifiquem os animais quando avistá-los. Ao divulgar isso para as crianças, acreditamos que possamos alcançar também os adultos, já que elas são multiplicadoras de informação para os pais", comenta Pedro.
Distribuição e lançamento – Ao todo, cinco mil exemplares serão distribuídos gratuitamente em escolas públicas (com prioridade para as rurais), em cidades com ocorrência de tamanduás no Mato Grosso do Sul. O lançamento será durante Congresso da SZB (Sociedade Brasileira de Zoológicos), no dia 6 de abril, em Brasília.
O pesquisador ArnaudDesbiez, coordenador do projeto Bandeiras e Rodovias, acredita que o livro é uma ferramenta importante para ampliar o conhecimento sobre o trabalho de conservação. “A Sociedade Brasileira de Zoológicos está lançando o Ano do Tamanduá, assim, vamos trabalhar com os diferentes zoológicos da SZB para poder alcançar e distribuir o livro e o manual nas salas de aula do país. Esse apoio dos educadores de zoológicos é fundamental para a gente poder aumentar o alcance da nossa mensagem pela proteção da espécie”, diz.