Acusados na Lama Asfáltica tiveram contas e até veículos bloqueados
Além de decretar o bloqueio dos bens dos 21 denunciados por envolvimento em irregularidades na execução de obras de “tapa buraco” em Campo Grande, o juiz Marcelo Ivo de Oliveira, da 1ª Vara dos Direitos Difusos, Coletivos, Individuais e Homogêneos, decretou a indisponibilidade de veículos e o bloqueios de ativos financeiros dos acusados. Só de bens indisponibilizados, a ordem é bloquear R$ 315,98 milhões.
A decisão, em caráter liminar, é referente ao Inquérito Civil 10/2015, em que foram analisados cerca de 30 contratos para a execução do serviço de tapa buraco em Campo Grande, no período de 2010 a 2012. De acordo com a denúncia feita pela Força Tarefa criada no MPE (Ministério Público Estadual), até janeiro deste ano haviam sido liberados para atender esses contratos R$ 372 milhões.
A Força Tarefa apurou que as irregularidades começaram já com a contratação da Selco Engenharia para executar o serviço de recuperação das vias asfaltadas na Capital. Segundo os promotores de Justiça, a concorrência pública 021/2012 foi direcionada para que a Selco vencesse o certame.
Para isso, conforme consta na decisão do magistrado, o então secretário municipal de Infraestrutura, Transporte e Habitação, João Antonio De Marco, e o presidente da Comissão de Licitação à época, Bertholdo Figueiró, incluíram no edital algumas restrições para dificultar a participação de outras empresas na disputa. Uma dessas medidas “restritivas” seria a obrigatoriedade das empresas interessadas na disputa, pagarem R$ 1 mil a título de “custo reprográfico”.
As irregularidades prosseguiram após a licitação. A Selco, além de receber por serviço não executado, ainda praticou superfaturamento na execução de algumas obras. O juiz Marcelo Ivo de Oliveira cita, por exemplo, que Sylvio Darilson Cesco, fiscal de obras da Seintrha (Secretaria Municipal de Infraestrutura, Transporte e Habitação), “não apontou justificativas plausíveis às divergências encontradas nos valores referentes ao preço da tonelada do CBQU e da mão-de-obra, tendo sido demonstrados casos de contratos os quais o CBQU constava R$ 206,00 e R$ 171,50 num mesmo ano”. Segundo a investigação, o superfaturamento chegou a 88%.
Já o também fiscal da Sehintra João Parron Maria é acusado de aprovar serviço executado pela Selco sem a qualidade devida, e assim liberar o pagamento pelo trabalho. Um dos casos citados é a de um vídeo que foi veiculado em nível nacional, em que o operário da empresa é flagrado aplicando material de reparo no asfalto onde sequer havia buraco, no episódio que ficou conhecido como “tapa buraco fantasma”. A empresa, até o início deste ano, teria recebido mais de R$ 28 milhões, mesmo não tendo realizado o serviço para o qual havia sido contratada.
Na decisão o juiz afirma ainda que outro aspecto importante apresentado pela Força Tarefa do MPE é a irregularidade no uso de produtos para realizar o tapa buraco. “Os requeridos querem fazer crer a necessidade de aplicação de 4.406,34 toneladas de CBQU para tapar 57.911,46 m2 de buracos na região. Bem como as divergências entre a 12a medição do contrato nº 059/2012 com a 2a medição do contrato nº 125/2012, sendo no primeiro necessários 3.535 toneladas de CBQU para tapar 46.655 m2 de buracos, no segundo utilizou-se apenas 416,69 toneladas de CBQU para 42.971,91 m2”, diz trecho do documento.
Além do ex-prefeito Nelson Trad Filho e dos ex-secretários de Infraestrutura, Transporte e Habitação João Antonio De Marco, Semy Ferraz e Valtemir de Brito, se tornaram réu no processo Abimael Lossavero, Bertholdo Figueiró Filho, Caio Vinícius Trindade, Denis Puliti Simioli, Elias Lino da Silva, Fátima Rosa Cota Moral de Oliveira, Gerson Nina Prado, Ivane Vanzella, João Parron Maria, Luziano dos Santos Neto, Michel Issa Filho, Paulo Roberto Álvares Ferreira, Selco Engenharia, Sylvio Darlison Cesco, Uilson Domingos Simioli, Usimix Ltda e Vera Lúcia Ferreira Vargas.
A decisão é do último dia 16 e o juiz Marco Ivo de Oliveira deu prazo de 15 para que os acusados se manifestem. O ex-prefeito Nelson Trad Filho afirmou que tem todos os documentos que comprovam que tudo foi feito dentro do que estabelece a legislação. Disse ainda, que em 2011 instituiu o controle social da Operação Tapa Buraco e lembrou em em 2011 e 2012 o próprio MPE havia instaurado procedimento para apurar supostas irregularidades na execução desse serviço, mas foi arquivado por não ter sido detectado nenhum problema.
Tentamos contato também com os ex-secretário João Antonio De Marco, Semy Ferra e Valtemir de Brito, do ex-presidente da Comissão de Licitação Bertholdo Figueiró Filho, além dos fiscais Sylvio Cesco e João Parron Maria, mas eles não foram localizados. O processo estava sob sigilo e se tornou público nesta quarta-feira (23).