Revisão de decretos e tanques-rede: a pesca na visão de quem disputa o governo
Propostas também incluem ampliar a fiscalização nos rios e reativar conselho estadual
Riquezas no sentido mais amplo da expressão, os rios que cortam Mato Grosso do Sul são palcos de um conflito entre interesses econômicos e ambientais. Enquanto o turismo de pesca esportiva comemora medidas restritivas, como as que protegem o dourado e o pintado, os pescadores profissionais lamentam e apontam a perda do meio de subsistência.
No capítulo mais recente, portaria do Ministério do Meio Ambiente incluiu o pintado nas espécies ameaçadas de extinção, proibindo a pesca. A medida foi publicada em junho, mas ainda não está em vigor.
Neste caso, a administração estadual questionou o governo federal sobre a inclusão do pintado na lista e solicitou acesso ao estudo científico que subsidiou a publicação da Portaria 148. Na análise do governo de MS, o pintado não é uma espécie de extinção nos rios do Estado.
Toda vez que uma espécie entra pela primeira vez na lista oficial de “peixes e invertebrados aquáticos da fauna brasileira ameaçados de extinção” é aberto prazo para que os entes estaduais se manifestem sobre a vulnerabilidade.
Em âmbito estadual, a Lei 5.321, publicada em 11 de janeiro de 2019, proibiu pelo prazo de cinco anos a captura, embarque, transporte, comercialização, processamento e industrialização do peixe da espécie dourado em Mato Grosso do Sul. Em caso de flagrante, os infratores estão sujeitos à multa diária de até mil Uferms (R$ 46,9 mil) e interdição do estabelecimento.
Com a restrição da pesca, a ideia é que duas gerações do peixe, considerado o “rei das águas doces”, sejam preservadas. A legislação provocou polêmica e protesto de pescadores. A matéria chegou à Assembleia Legislativa em 2017, mas só foi aprovada no ano seguinte, numa segunda tentativa.
A restrição já repercute nos rios. Durante trabalho a campo, técnicos do Imasul (Instituto de Meio Ambiente de MS) afirmam que pescadores relatam que a quantidade de dourado aumentou ou ficou visualmente mais aparente a presença da espécie nos rios.
Segundo o instituto, existem vários tipos de medidas restritivas que podem favorecer o aumento das populações de peixes. Como aumento de tamanho mínimo, restrição de captura, restrição de áreas de pesca, proibição de petrechos, aumento de áreas protegidas e redução de cotas.
A proibição mais antiga de pesca, que já se aproxima dos 30 anos, é da piracanjuba. A espécie entrou na lista de proteção do governo federal em 1994. Quase três décadas depois, a espécie marca presença em grande quantidade na Bacia do Rio Paraná.
Na lista dos mais piscosos, estão os rios Paraguai, Aquidauana e Miranda. Contudo, conforme a PMA (Polícia Militar Ambiental), houve recuperação de estoques pesqueiros na Bacia do Rio Paraná, exigindo fiscalização nos afluentes, como o Rio Ivinhema, onde já se encontra pintado de 1m72.
Ainda de acordo com a fiscalização, a política restritiva de pesca adotada em Mato Grosso do Sul inclui de proibição de uso de redes a sistema de lacre que monitora quantas toneladas de pescado são retiradas dos rios.
A Federação de Pescadores e Aquicultores de Mato Grosso do Sul solicita a revogação de dois decretos estaduais: do “Cota Zero” e o que libera somente pesque e solte em trechos de nove rios que circundam o Parque Estadual do Parque do Rio Negro, incluindo o Miranda e o Aquidauana.
No “Cota Zero”, são liberados o transporte de uma espécie de peixe e cinco piranhas para o pescador amador. Segundo o presidente da federação, Pedro Jovem dos Santos Júnior, o pedido é de que seja permitido o transporte de cinco espécies de peixes. A federação representa 20 colônias, com 10 mil pescadores profissionais.
Diante desse cenário de impasse entre interesses econômicos e do meio ambiente, o Campo Grande News questionou as políticas para a pesca que serão adotadas por quem disputa o governo de MS.
Eduardo Riedel (PSDB)
Os recursos hídricos e os recursos pesqueiros são fundamentais porque compõem a nossa biodiversidade. As mudanças climáticas, os incêndios no Pantanal, mostram a urgente necessidade de medidas conservacionistas. Em relação à pesca, podemos dizer que o incentivo à pesca esportiva atraiu um novo turista, criou oportunidades e gerou renda para muitas famílias, porém, isso não ocorreu em todas as regiões.
A pesca profissional apresenta ainda algumas dificuldades para quem vive dela. Portanto, nós vamos oportunizar para que todas as regiões de pesca esportiva possam se organizar e se estruturar para receber turistas e desfrutar das oportunidades trazidas pelo setor.
Também vamos rever toda legislação de pesca para criar um novo ordenamento jurídico capaz de conciliar a conservação da piscosidade dos rios e a necessidade de sobrevivência dos profissionais, com intuito de formular um políticas públicas definitivas.
Capitão Contar (PRTB)
É importante que façamos um trabalho baseado em estudos técnicos, porque nós precisamos, obviamente, aliar a preservação do meio ambiente à manutenção da atividade pesqueira em Mato Grosso do Sul. O futuro da pesca, seja a de subsistência ou turística, está totalmente ligado à capacidade de manter a abundância de peixes em nossos rios.
Não existe futuro para a pesca se a atividade não estiver alinhada às práticas sustentáveis de proteção dos rios, das nascentes e das espécies de peixes. Sem isso, não temos pesca profissional, não temos turismo de pesca, nem poderemos movimentar a cadeia de negócios que envolve o setor, assim não temos mais nada.
Dessa forma, quero poder me reunir com os melhores especialistas das áreas de turismo e pesca e trazer soluções equilibradas. Sei que existem questões antagônicas, uns querem liberar tudo, outros proibir tudo, eu sou a favor do equilíbrio, o que é bom para todos e para o meio ambiente. Na minha opinião tem que haver mais fiscalização, um trabalho intenso para coibir o pescador ilegal.
O pescador esportivo e o turista geram renda e desenvolvimento para o nosso estado. A minha proposta é que esse estudo e planejamento seja feito a várias mãos, onde todos possam sair ganhando, inclusive o meio ambiente e os peixes, que são um grande atrativo para os turistas e pescadores, no nosso Mato Grosso do Sul.
Rose Modesto (União Brasil)
A pesca amadora ou desportiva e a pesca profissional são atividades que geram emprego, renda, movimentam a economia e dependem, fundamentalmente, de uma exploração sustentável dos estoques pesqueiros. Por isso, é imprescindível que sejam respeitadas as orientações técnicas para a manutenção desse equilíbrio. Aliás, são essas orientações que norteiam as políticas públicas para o setor, como o estabelecimento de cotas, épocas de interdição e tamanhos recomendados para as espécies.
Estudos do Ministério do Meio Ambiente apontam que, no Brasil, há bacias hidrográficas com diminuição significativa dos estoques de peixes, mas, aqui, no estado, com manejo adequado, principalmente na Bacia do Rio Paraguai, os estoques podem ser explorados com sustentabilidade.
Vamos governar com a população, por isso, nossa primeira iniciativa será incentivar a reativação e o fortalecimento do Conselho Estadual de Pesca, para que todos os atores desse segmento possam ter maior participação nas definições de manutenção, alteração ou revogação de normativas para o setor.
Vamos propor, também, a revisão das normativas estaduais da pesca, especificamente dos regramentos que se encontram dispersos em resoluções e decretos publicados em épocas diferentes, para ordenar, atualizar, sintetizar esses regramentos e submetê-los à Assembleia Legislativa. No nosso governo, com a participação de todos, vamos trabalhar para aliar produção e preservação ambiental, pelo bem dos sul-mato-grossenses.
Marquinhos Trad (PSD)
Vivemos no Estado do Pantanal, um Patrimônio Natural da Humanidade, que atrai muitos turistas, encantados com a beleza única do nosso Estado. Preservar nosso patrimônio é questão vital para o mundo e fundamental para o turismo, mas não podemos esquecer que muitas pessoas têm como única fonte de renda a pesca, que para eles também é questão de sobrevivência. Diante desta importância da preservação ambiental e sobrevivência da nossa gente, é preciso ter muita responsabilidade.
Na região de Aquidauana, por exemplo, 3.500 homens e mulheres que vivem da pesca passam por momentos de dificuldade e não recebem ajuda do Governo do Estado. Não recebem uma cesta básica como apoio neste período. São cinco meses sem saber se terão o que comer no dia seguinte. Na colônia eles não têm um barco para atender um ribeirinho em caso de emergência. Esta população está abandonada e precisa de apoio do Estado.
A legislação não pode ser feita pensando em agradar um grupo. Tem que ter este cuidado com quem sobrevive desta atividade. Vamos adotar políticas de preservação do meio ambiente e espécies, mas também garantir renda para os pescadores profissionais e ribeirinhos. Criar oportunidades e um plano para assistência alimentar e de necessidades básicas.
Giselle Marques (PT)
O problema da quantidade de peixes nos rios de Mato Grosso do Sul não se resolve com a Cota Zero que, a princípio, pode se mostrar como uma medida ecológica, mas, na verdade, não atinge o cerne do problema, e prejudica de forma extrema os pescadores e a população ribeirinha, que têm uma relação respeitosa com a saúde dos rios.
A diminuição da oferta de recursos pesqueiros nos rios está mais ligada ao uso indiscriminado de agrotóxicos pelo agronegócio, ao desmatamento, às hidrelétricas, às dragagens, do que às atividades dos pescadores. Pretendo fortalecer o IMASUL e a Polícia Militar Ambiental, realizando novos concursos públicos, investindo na capacitação e na remuneração dos servidores públicos, para aumentar a fiscalização quanto à legislação de proteção ambiental, em especial combatendo o abuso dos agrotóxicos, e isso vai aumentar nossos recursos pesqueiros.
Como governadora, pretendo convocar um grande debate para a discussão desse problema, contemplando a Federação de Pescadores e Aquicultores de Mato Grosso do Sul, as comunidades ribeirinhas e quilombolas. Intensificar a produção de peixes em tanques-rede pode ser uma boa alternativa para o setor. Para tanto, pretendo liberar o acesso dos pescadores profissionais e aquicultores a linhas de crédito, à assistência técnica, investir na logística e na colocação da produção no mercado, fomentando o associativismo.
Cabe ao governo realizar estudos constantes de monitoramento da qualidade da água a fim de reduzir o impacto ambiental, de modo que não haja redução da biodiversidade, e nem se esgote ou comprometa a saúde dos nossos rios, uma das maiores riquezas naturais do MS, indispensáveis também para o turismo.
André Puccinelli (MDB)
A atividade pesqueira em Mato Grosso do Sul precisa de um olhar atento e cuidadoso, para que possamos garantir a preservação dos nossos rios, das espécies de peixes e o trabalho de todos os profissionais que dependem dessa atividade.
Nesse sentido é importante que seja revisto, em conjunto com as instituições responsáveis - Imasul, Embrapa, PMA, universidades e representantes das entidades de pescadores e aquicultores aqui do estado - as políticas vigentes quanto à pesca nos rios do estado, assim como atuar de forma permanente junto ao Ministério do Meio Ambiente nas questões que abordem a área.
Também é preciso pensar na modernização das ações relativas ao controle dos recursos pesqueiros, com apoio das comunidades interessadas, assim como rever os decretos solicitados pela Federação dos Pescadores e Aquicultores de Mato Grosso do Sul.
Entre as questões importantes é preciso criar alternativas para diversificar as atividades profissionais dos isqueiros/pescadores e suas famílias para suprir possíveis lacunas com as políticas de restrição da pesca no estado. Além disso, incentivar o turismo de pesca nas diversas bacias hidrográficas de Mato Grosso do Sul, além de incentivar novos nichos para o turismo de contemplação, em especial nos rios com restrição de pesca, como forma de criar oportunidades para absorver mão de obra das comunidades ribeirinhas.