Brasil é denunciado na ONU por conta de conflitos em MS
ONU e mecanismos da organização internacional cobrarão respostas do governo brasileiro
A violência contra indígenas da etnia Guarani-Kaiowá, em Amambai e Naviraí, levou o Brasil a ser denunciado na ONU (Organização das Nações Unidas), nesta segunda-feira (27). O CIMI (Conselho Indigenista Missionário) fez um "apelo urgente" ao organismo internacional diante dos ataques que culminaram em uma morte e sete feridos, oficialmente.
O "apelo urgente" é um mecanismo criado para permitir que denúncias emergenciais possam ser realizadas diante de um caso de violência iminente ou de crise instaurada. A partir da nova denúncia, as relatorias da ONU e mecanismos da organização internacional cobrarão respostas ao estado brasileiro. O conflito começou na última quinta-feira (23). Policiais continuam na região de Amambai, onde o clima é mais tenso.
A petição salienta que os ataques foram realizados pela polícia e agentes privados de segurança, resultando na morte do indígena Guarani-Kaiowá, Vito Fernandes, que foi sepultado nesta tarde, além "vários feridos".
De acordo com a entidade, a invasão não teve a autorização da Justiça. Na comunidade de Guapo'y, na cidade de Amambaí, os ataques foram realizados pela Polícia Militar do Mato Grosso do Sul, assim como na região de Tekohá Kurupi/São Lucas em Naviraí.
Segundo o documento, obtido pelo UOL, os policiais bloquearam os indígenas feridos de receberem atendimento médico no hospital de Amabaí, alegando que eles eram "muito violentos".
Dois adolescentes indígenas, feridos em confronto com o Batalhão de Choque na Fazenda Borda da Mara, em Amambai, continuam internados no Hospital Regional de Ponta Porã. Além dos meninos, outros dois adolescentes e três adultos da comunidade guarani-kaiowá precisaram de atendimento médico após o confronto. Três policiais do Batalhão de Choque também ficaram feridos. Todos, com exceção dos dois adolescentes que estão em Ponta Porã, já tiveram alta.
"Os relatórios e imagens do ataque indicam que a PM fez uso de veículos, armas letais e não letais e até mesmo um helicóptero, usado como plataforma de tiro contra as famílias indígenas", afirma a petição.
O documento ainda ataca a justificativa apresentada pelo Departamento de Segurança Pública do Estado. Segundo o grupo, o argumento "reproduz uma série de preconceitos contra os povos indígenas e não encontra apoio na realidade dos fatos".
Um deles seria de que a comunidade indígena estava envolvida com o tráfico de drogas e sendo chamada de "paraguaia".
"Ao contrário do que o Estado diz, não foi uma ação de combate ao tráfico de drogas, mas uma ação de despejo contra uma retomada dos povos Guarani e Kaiowá que não poderia ter ocorrido - porque não houve ordem judicial e porque as disputas possessivas envolvendo os povos indígenas são objeto de jurisdição federal, não estadual", disse.
O movimento pela retomada dos Guapo'y tekoha, área contígua à Reserva Indígena Amambai, começou no final de maio, quando o Guarani Kaiowá Alex Lopes, de 17 anos, foi assassinado em uma área que, segundo os Kaiowá e Guarani, pertencia à Reserva Indígena Taquaperi em Coronel Sapucaia (MS), mas foi apropriada por fazendeiros.
"Na Reserva Amambai está grande parte da família de Alex, que, tocada pela dor da perda e pela necessidade de recuperar áreas de ocupação tradicional do povo, decidiu retomar os Guapo'y tekoha, dois dias após o assassinato. Eles foram inicialmente expulsos por uma ação policial e do agronegócio, mas retornaram em 24 de junho, dispostos a ocupar o local da fazenda", disse.
Para o grupo, o que ocorre no Mato Grosso do Sul é um espelho do resto do país. "Por todo o Brasil, os povos indígenas têm mobilizado e denunciado todo esse processo de violência incentivado pelo próprio Estado brasileiro, o que os vitima e seus aliados, como no caso recente ocorrido com o indigenista Bruno Pereira e o jornalista Dom Phillips. A tragédia ocorrida no Mato Grosso do Sul contra os Kaiowá e Guarani corrobora esta denúncia", diz.
"Os gritos de justiça de Vito Fernandes somam-se agora aos de Alex, Bruno e Dom, assim como dezenas de líderes Guarani e Kaiowá assassinados", afirma o documento.
"Os recentes assassinatos do especialista indígena Bruno Pereira e do jornalista Dom Philips revelam o que o país Brasil se tornou, principalmente nos últimos quatro anos", aponta o documento.
"O aumento das invasões de territórios indígenas e da violência tem a cumplicidade e o incentivo do governo brasileiro, que abandonou a política de proteção territorial e alimentou um ambiente em que a vida é brutalmente aniquilada", disse.
"No caso de Bruno e Dom, as forças policiais demoraram muito tempo para agir. Entretanto, em apenas 48 horas, essa mesma polícia afirmou, de forma precipitada e incompreensível, que não havia constituintes ou crime organizado por trás desses dois assassinatos, desconsiderando os relatórios da organização indígena local sobre a situação na região. A impunidade é a maior segurança daqueles que matam e principalmente daqueles que ordenam ser mortos no Brasil", completaram.