Com paralisia grave, Sofia viaja mil quilômetros para conseguir vacinar em MS
"Não queria falsificar nenhum documento. Minha intenção era que minha filha tivesse o que era justo", diz mãe
Um direito que seria de todos, mas para Sofia custou uma viagem de quase mil quilômetros contando só a vinda. Com paralisia cerebral grave, a adolescente de 16 anos viajou de carro de São Paulo até Campo Grande para se vacinar aqui. A Capital abriu para adolescentes com comorbidades sem exigir comprovante de residência.
Sofia tem paralisia cerebral grave do tipo quadriplégica e com comprometimento respiratório e circulatório. Desde o início da pandemia da covid-19 estava em isolamento rigorosíssimo, inclusive sem fazer as terapias necessárias, o que acarretou prejuízo e lhe trouxe dores.
Por achar que seria muito arriscado trazer Sofia de avião, mãe e filha vieram de carro junto de um amigo que já foi vacinado e tomando todos os cuidados. "Paramos para dormir em Castilho, na casa de uma tia, e ainda assim, de máscara", conta Denise. No total, foram 15h de viagem até chegar aqui.
Como só Mato Grosso do Sul havia incluído o grupo na vacinação, por pressão de um exército de mães que brigaram muito por isso, Denise colocou Sofia no carro e veio. "Enquanto não sai no PNI [Plano Nacional de Imunização], falta vontade política", diz. Isso porque São Paulo foi o primeiro local onde a vacinação começou, no dia 17 de janeiro.
A mãe fez o cadastro de Sofia em Campo Grande, confirmou com a Sesau (Secretaria Municipal de Saúde) que não precisaria do comprovante de residência e preparou as malas.
Ao chegar aqui, na última segunda-feira (5), descobriu que o calendário não contemplava mais os adolescentes. "Liguei na ouvidoria, expliquei, disse que ela tinha dor e que precisava muito retomar as terapias. Eu não menti, contei que todo tratamento dela era em São Paulo", relata a mãe.
Sofia não tem lesão cognitiva, compreende a pandemia e estava muito ansiosa para vacinar. "A emoção eu ainda estou processando, porque a vacina dela veio junto com a aprovação na Câmara do pedido de urgência para a votação do PL 2112", comenta Denise.
A aprovação deste projeto fará com que todos tenham o direito da vacinação reconhecido. "Porque não é justo ter que viajar, sabe? Muitos nem conseguem, como adolescentes que dependem de oxigênio", exemplifica.
A gravidez de Denise era gemelar, Sofia e a irmã gêmea nasceram prematuras. A outra não resistiu e morreu com 40 dias de vida. Já Sofia enfrentou quase três meses de UTI e teve cinco sepses.
"Por isso meu pânico de uma doença que poderia nos fazer reviver todo esse universo. A pandemia trouxe o temor da morte e da UTI para todas as casas, mas para quem já viveu isso e tem um risco maior de agravamento, é um pesadelo".