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Cidades

Em 4 anos, contrato suspeito saltou de R$ 21,5 milhões para R$ 102,1 milhões

Investigação aponta envolvimento de três conselheiros do Tribunal de Contas afastados em fraude

Lucia Morel | 08/12/2022 18:28
Conselheiros Waldir Neves, Ronaldo Chadid e Iran Coelho das Neves foram afastados. (Foto: Reprodução)
Conselheiros Waldir Neves, Ronaldo Chadid e Iran Coelho das Neves foram afastados. (Foto: Reprodução)

De R$ 21,5 milhões, conforme contrato assinado em 2018, a Dataeasy Consultoria e Informática Ltda já recebeu R$ 102.153.449,61 entre dezembro de 2018 e março deste ano, pelo fornecimento de mão de obra e dois softwares, sendo que um deles nem sequer foi implementado pelo TCE/MS (Tribunal de Contas de Mato Grosso do Sul). O contrato é um dos alvos da operação Terceirização de Ouro, deflagrada hoje pela PF (Polícia Federal).

As investigações da Polícia Federal e da Receita Federal identificaram o envolvimento de três conselheiros estaduais em fraude em licitação que escolheu a Dataeasy como empresa para prestação de serviços de apoio às atividades de tratamento de informações.

O contrato, assinado em 24 de janeiro de 2018, prevê custo de R$ 21,5 milhões em 12 meses de serviços que incluem serviços técnicos profissionais e de apoio administrativo, técnico e operacional.

Segundo as investigações, o contrato já chega a pagamentos R$ 102.153.449,61 com aditivos anuais desde 2019, sendo o último em janeiro deste ano com validade até janeiro do ano que vem. A “empresa que recebeu mais de R$ 100 milhões do TCE/MS desde 2018, cujo contrato foi recentemente renovado pelo Presidente do TCE/MS, conselheiro Iran Coelho Das Neves, até 24/01/2023”.

Entre as irregularidades identificadas no andamento da licitação, PF e RF relataram que houve celeridade incomum para a abertura do procedimento, bem como na aceitação dos termos, além de que, após a abertura, “a empresa Dataeasy apresentou sua proposta em tempo muito exíguo, em aproximadamente três horas após o envio do e-mail pelo TCE-MS, o que parece algo razoavelmente inviável”.

Também identificam que três empresas apresentaram propostas na disputa, com preços semelhantes, “muito embora não houvesse condições adequadas para precificação”, e ainda que “o próprio termo de referência mencionou que uma vistoria técnica seria uma condição necessária para a correta precificação dos serviços”. Com isso, concluiu-se que “Essas circunstâncias representam indícios de que o procedimento de cotação de preços do Pregão Presencial nº 10/2017 possa ter sido dolosamente manipulado”.

Há ainda indícios de possível falsidade de atestado de capacidade técnica apresentado pela empresa vencedora e ausência de apresentação de garantia, exigida para a contratação.

Outro ponto suspeito diz respeito à forma de pagamento da oferta dos serviços, baseadas em USE (Unidades de Serviços Executados), ou seja, por tarefa executada e não por quantidade de trabalhadores e as respectivas qualificações necessárias, o que “restringiu a concorrência pública do certame, por impedir a mensuração do efetivo custo da mão de obra para o oferecimento da proposta”.

Para a investigação, essa modalidade utilizada dificulta a fiscalização do contrato e controle dos pagamentos efetuados, “podendo ensejar o superfaturamento o desvio de recursos públicos”.

Por fim, identificou-se a acumulação indevida de objetos distintos em uma licitação para afastar empresas de participarem. “O fornecimento de mão de obra e o fornecimento de softwares no Pregão n. 10/2017 são relações contratuais completamente distintas”, diz a peça que pede a busca e apreensão, além da prisão dos conselheiros.

Fonte: Receita Federal
Fonte: Receita Federal

Para agravar a situação, “foi constatado, a nosso ver, que embora o contrato exija o fornecimento de dois softwares pela empresa, foi fornecido apenas um, porquanto o segundo não chegou a ser efetivamente utilizado”.

“Considerando que o software de gestão documental não foi colocado em funcionamento no TCE/MS e mesmo assim o contrato com a DATAEASY prosseguiu (e foi anualmente renovado), temos, a nosso ver, mais uma confirmação de que a exigência de tal sistema foi feita para direcionamento criminoso da licitação (pois o sistema não é necessário para o TCE), visando impedir a participação de empresas de terceirização de mão de obra que não atuassem na área de fornecimento de softwares”.

QUEM FEZ O QUE – O conselheiro Ronaldo Chadid é investigado desde as primeiras fases da Operação Lama Asfáltica e desta vez, a investigação descobriu a realização de frequentes encontros/reuniões entre o conselheiro e os servidores Parajara Moraes Alves Júnior e Douglas Avedikian.

“Os encontros ocorreriam semanalmente em uma sala de um edifício comercial em Campo Grande. Os referidos servidores estão diretamente envolvidos na contratação e fiscalização da empresa Dataeasy”, diz a decisão que proferiu as buscas e apreensões de hoje, bem como o monitoramento eletrônico de Chadid, Iran Coelho das Neves (presidente do Tribunal de Contas do Estado) e Waldir Neves.

Este último, conforme as alegações, “utiliza funcionários contratados pela empresa Dataeasy Consultoria e Informática Ltda para resolução de questões pessoais, sem qualquer relação com os serviços contratados e remunerados pelo Tribunal".

Policiais federais em movimentação no prédio do Tribunal de Contas hoje de manhã. (Foto: Marcos Maluf)
Policiais federais em movimentação no prédio do Tribunal de Contas hoje de manhã. (Foto: Marcos Maluf)

Além disso, Neves também foi identificado em grave situação de suposta solicitação de propina que envolve assessores dele e empresários de uma segunda empresa investigada, a L&L Comercial e Prestadora de Serviços.

Por fim, Iran Coelho “foi responsável por firmar os termos aditivos do contrato com a Dataeasy partir de janeiro de 2019 até a presente data, mesmo diante dos indícios de irregularidades apontados na deflagração da fase ostensiva das investigações em 08/06/2021”.

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