Capitão de aldeia tortura irmão a marteladas, grava vídeo e revolta indígenas
Funai já solicitou presença do Estado por meio das forças de segurança pública, mas teve pedido negado
Um vídeo chocante gravado pelo capitão da Aldeia Jaguapiré, Valdenir Romero, foi divulgado nas redes sociais pelo próprio autor, nesta sexta-feira (10).
O território guarani-kaiowá, onde as imagens foram feitas, fica no município de Tacuru, a 427 km de Campo Grande. A denúncia já chegou ao conhecimento da Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas).
Conforme o coordenador regional da fundação, Tonico Benites, o capitão da comunidade divulgou em grupos de lideranças indígenas a sessão de tortura com marteladas nos pés e nas mãos do próprio irmão, o indígena identificado como Edvaldo Romero. A vítima segue desaparecida há mais de 24h, o que preocupa a todos.
“Ele compartilhou o vídeo por volta das 17h e ontem à noite já acionei as polícias Civil, Militar e Federal para irem até a área ver o que aconteceu. Mas até agora ninguém atendeu ao nosso pedido. Queríamos que fizessem a prisão em flagrante, mas alegam que só poderão registrar o caso na segunda-feira”, lamentou Tonico.
O coordenador disse ao Campo Grande News que também conversou com o autor do crime. “O próprio capitão, liderança eleita, confirmou o que fez. Justificou a ação alegando que o irmão teria se envolvida com grupo que rouba as coisas da família e troca por droga ou bebida, além de vender entorpecentes. Também reclamou que a polícia demora muito para atender os chamados da comunidade e decidiu resolver do jeito dele”, conta.
A vítima tem problema de saúde mental e física. Ele era cuidado pela mãe dos dois, mas ela faleceu há dois meses e desde então o rapaz se tornou andarilho, em situação de rua. “Expliquei ao capitão que ele cometeu um crime bárbaro e chocante. Como membro da Funai não vou admitir que ninguém faça isso. Não serei conivente com crimes que violam os direitos humanos, não importa quem seja”, acrescentou o coordenador.
No entanto, a informação é que o autor continua muito agressivo, deixando a comunidade revoltada e aterrorizada. O grupo de mulheres que compõem o conselho da Kuñangue Aty Guasu denunciou o caso na internet. Em comunicado público elas afirmam que o povo guarani e kaiowa está cercado de muitas violações dentro e fora dos territórios.
“São inúmeras mortes que acontecem anualmente, já acompanhamos famílias em luto, onde os depoimentos eram que o corpo da vítima já veio a óbito mas o ódio é tão grande que o agressor/violador/assassino seguiu desferindo golpes e golpes até se cansar. Precisamos falar urgente da saúde mental dos jovens indígenas. Esperamos que a autoridades cumpram com seu papel, assim como a assistência social de lá. As violações em territórios não devem jamais ser respondida na violência”, ressaltou.
A prática de tortura com marteladas, corte de dedos e amarração de corpos em pau de arara era utilizada por capitães não indígenas na década de 70 e 80 dentro da reserva indígena.
A medida era uma implementação da ditadura e que mesmo tendo sido abolida, continuam presentes nas aldeias, como a própria imagem mostra. As marcas da violência são tão latentes que o autor até o momento mostrou não estar arrependido do que fez e se quer apagou o vídeo do grupo de líderes indígenas.