Em meio ao caos, infectologistas garantem que Dourados esconde dados da covid

Dourados vive situação de caos, com leitos de UTI (Unidade de Terapia Intensiva) lotados de pacientes com covid-19 e sem vagas para novos infectados. O problema é mais grave na rede privada que, segundo relatos, não tem mais espaço para pacientes com a doença. Quem atua pelo SUS (Sistema Único de Saúde), diz que isso está prestes a ocorrer com as vagas públicas.

Relatos de infectologistas ouvidos pelo Campo Grande News revelam realidade que não é mostrada nos boletins oficiais, já que são contabilizados para tais dados, apenas os casos confirmados da doença e não os suspeitos.

Ou seja, mesmo que uma vaga de UTI destinada a paciente grave com o novo coronavírus seja usado por uma pessoa que ainda não teve a confirmação da doença, na conta oficial não aparece como leito ocupado por covid, o que acaba alterando os números, mas não a realidade.

Ao todo, são 48 leitos de UTI em Dourados destinados especificamente a pacientes com o novo coronavírus, segundo publicação de mapa de leitos do governo do Estado em Diário Oficial em 8 de junho. Desses, 15 são na rede privada e 33 pelo SUS (Sistema Único de Saúde).

Segundo profissionais da linha de frente de combate ao novo coronavírus na cidade, todos estão ocupados neste domingo.

“Nos boletins, os leitos ocupados por casos suspeitos não contam, por isso aparece como se não estivesse todos ocupados”, diz médica que falou sobre o caos sob condição de anonimato.

Outro médico, também sem ser identificado, fez relato similar, sustentando que “o boletim reflete só os casos confirmados, e dá então a impressão que não estão todos ocupados, porque só contam os confirmados. Mas todos os pacientes com SRAG (Síndrome Respiratória Aguda Grave) em investigação ocupam leito destinado à covid-19”.

Em transmissão ao vivo, a SES (Secretaria de Estado de Saúde) mostrou que das 48 UTIs destinadas à covid-19 nas cidades, há 17 ocupadas, representando 35%.

No dia 12 de junho, o governo do Estado anunciou 15 novos leitos para Dourados, todos a serem instalados no HU-UFGD (Hospital Universitário da Universidade Federal da Grande Dourados). A entrada em funcionamento deve ocorrer em 10 dias.

A estrutura das unidades estão sendo doadas pela empresa JBS, com o objetivo de auxiliar a saúde pública, principalmente nas cidades em que a empresa tem plantas industriais.

Ainda há leitos de UTI para outras especialidades, segundo os médicos que a reportagem entrevistou, mas foi unânime a informação de que a situação tende a se agravar, se não houver ampliação.

A situação grave determinou procedimento do MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul). Em ofício no dia 13 de junho, deu 48 horas para que a prefeitura de Dourados tome atitudes para conter o avanço da doença, como é possível ler aqui.

Hospital da Vida – Vale ressaltar que no mapa estadual de leitos de covid-19, dos 33 leitos públicos, 20 são no Hospital da Vida, onde os profissionais ouvidos pela reportagem, informaram haver um surto do novo coronavírus entre os funcionários, inclusive com muitos deles afastados com suspeita da doença ou por terem sido diagnosticados com ela.

Para o médico que falou com o Campo Grande News, as condições do local são precárias e equipamentos de proteção individual para evitar contágio chegaram há pouco, entregues pelo governo do Estado.

“Inúmeros profissionais do Hospital da Vida estão com covid ou suspeitos e foram afastados. E isso causa outro problema que é a falta de gente para atender, porque os que não afastados, não são repostos”, comentou. O próprio profissional que falou com a reportagem está afastado.

Recentemente, em 10 de junho, o Campo Grande News revelou em matéria que idoso de 80 anos, morador de Iguatemi, pode ter sido infectado por covid-19 dentro do hospital. Leia mais aqui.

Outro problema lá, segundo profissional que atua apenas na rede pública de saúde, da qual o hospital faz parte, é que os 20 leitos de UTI relatados ainda não foram implantados. Caso seja real, Dourados conta com apenas 28 e não com 48 vagas em UTI para covid-19.

Demora – Na avaliação dos profissionais ouvidos, a administração municipal de Dourados está demorando para tomar atitudes frente à pandemia. “São pelo menos 40 dias de atraso na tomada de atitudes”.

Para a profissional, “não tem pessoal pra trabalhar, precisamos de mais respiradores, de fisioterapeutas, enfermeiros e isso tinha que ter sido visto antes da pandemia, porque não tem mais gente pra contratar”, lamenta.

De acordo com outra profissional ouvida, que atua apenas na rede pública, a situação é crítica em todo tempo, mas com a chegada do novo coronavírus, piorou. “A necessidade de UTI e isso piora tudo”, lamentou.

O secretário de estado de saúde, Geraldo Resende, informou que determinou auditoria em todas as unidades hospitalares de Mato Grosso do Sul para confirmar a taxa de ocupação de leitos, como também falou em live, aqui.

Sobre a subnotificação de Dourados, ele apenas disse que "acredita no que as secretarias repassam", e que a auditoria vai encontrar algum problema, se houver.

Em nota, a Sociedade de Infectologia de Mato Grosso do Sul mostrou preocupação com a curva ascendente da covid-19 em Dourados, que ultrapassou a marca de 100 casos por 100 mil habitantes.

A entidade pede a divulgação da taxa de ocupação global, por todas as causas, dos leitos de UTI e, especificamente, da covid-19. A nota, assinada pela diretoria da sociedade de infectologia diz que o número de casos pode subir exponencialmente se não forem adotadas medidas “robustas” de contenção e controle.

Prefeitura - A prefeitura de Dourados insiste que dos 44 leitos de UTI destinados a covid-19, apenas 15 estão com pacientes. O município lembra que tem reserva de vagas em dois hospitais particulares da cidade, o Evangélico e o Santa Rita, e pode requisitá-las caso a lotação chegue ao máximo.