A normalização da cadeirada em debates acalorados
Vivemos um período em que a violência, em suas diversas formas, tem se tornado cada vez mais visível e, de certo modo, normalizada. O estímulo à violência pode ser observado não apenas nas ruas, mas também nas redes sociais, nos discursos públicos e, de forma preocupante, na política. O aumento dos debates acalorados no campo da política tem contribuído para uma escalada de tensões que muitas vezes resulta em agressões verbais e físicas. Esses tipos de comportamentos violentos têm se tornado cada vez mais comuns e por mais que não seja tolerado, tem sido amplamente disseminado por mídias que promovem o sensacionalismo, que satirizam essas ações e que transformam em “memes” a violência ocorrida nos debates políticos, antes pautados por discussões de ideias e políticas públicas, agora muitas vezes são palco de acusações e incitação à violência contra oponentes, resultando em uma espécie de “espetáculo da violência”.
Isso faz parte da cultura da normalização a violência, em um mundo hiperconectado, a violência é constantemente reproduzida e consumida em tempo real, vídeos de agressões, discursos de ódio e ataques políticos se espalham pelas redes sociais, transformando a violência em algo que é testemunhado e compartilhado por milhares de pessoas em questão de segundos. Isso cria uma percepção de que esses atos são parte da dinâmica cotidiana, dessensibilizando o público e, em alguns casos, legitimando comportamentos violentos.
Em um passado bastante presente, podemos ver a literatura sendo reescrita, obviamente dada as devidas proporções. No livro escrito por Margareth Atwood (1985), em o Conto da Aia, onde é escrito uma obra distópica que se passa em um futuro, em que os Estados Unidos foram substituídos pela República de Gilead, um regime teocrático e autoritário, a violência contra as mulheres, e de forma geral com as pessoas através da imposição de um regime autoritário através da religiosidade faz com que as pessoas normalizem e entendam a violência como algo naturalizado.
Esse cenário, embora ficcional, pode ser visto como um espelho perturbador de tendências contemporâneas, especialmente quando relacionada à ascensão da extrema direita em diversos países ao redor do mundo. Ver a violência como algo normalizado não é um ato político, e nem restrito a um partido de esquerda ou direita, porém ver isso ocorrendo dentro de um ambiente político é assustador, pois, os princípios da política são fundamentais para orientar a organização, o funcionamento e a legitimidade do poder nas sociedades como um todo e não em partes ou lados, e ver esse cenário violento só aumenta e dissemina uma cultura de ódio e engajamento a violência gratuita e sem freios.
(*) Lia Rodrigues Alcaraz é psicóloga formada pela UCDB (2011), especialista em orientação analítica (2015) e neuropsicóloga em formação (2024). Trabalha como psicóloga clínica na Cassems e em consultório.
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