Na relação entre passageiro e motorista de Uber, conversa evita “climão”
Para muitos, quebrar o gelo durante a corrida é também a melhor forma de chegar ao destino mais rápido.
Conversa durante viagens com motoristas de aplicativos é visto como distração para uns e falta de noção para outros. O diálogo muitas vezes é usado para “quebrar o gelo”, mas até que ponto isso pode incomodar? Ao entrar em uma viagem é de praxe alguma das partes cumprimentar ou confirmar o nome, no entanto, as respostas para essas perguntas podem ser um sinal ao condutor se pode ou não dar continuidade no papo. É preciso ser esperto para contornar a situação e não passar por inconveniente.
Israel Melkizedeque, 29 anos, é ambulante e relata que toda vez que chama uma corrida pelo aplicativo da Uber, prefere conversar com o motorista, assim o tempo passa mais rápido. “Faço isso para quebrar o gelo, comento sobre política, esporte e outros assuntos para não fique aquele clima chato no final”, disse.
Ele trabalha com o público vendendo suas mercadorias e diz que é preciso dialogar com todos, no entanto, afirma que suas seis irmãs não gostam de bater papo, principalmente com motoristas. “Elas só querem chegar ao destino. As pessoas expõem suas vidas no Facebook, Whatsapp e tem momento que não quer conversar com ninguém”, fala. Para Israel, o signo também ajuda no dia a dia. “Sou libriano e tento chegar ao ponto de equilíbrio. Ser mais neutro possível”, completa.
Para evitar que ambas as partes passem por momentos de desconforto, a Uber está testando nos Estados Unidos, um novo sistema no qual as pessoas que chamarem uma corrida podem escolher se querem ou não falar com o condutor. A novidade também é em relação ao ar condicionado, para os passageiros optarem pela temperatura ideal.
O presidente do sindicato que representa os motoristas de Mato Grosso do Sul, Lohan Maycon diz que a novidade ainda não tem previsão de chegar ao Brasil. “O teste está acontecendo, porém não sabemos quando vai espalhar pelo mundo. Contudo, será bom para conhecer o perfil do passageiro, pois a gente nunca sabe quem está embarcando, se quer conversar ou não, se o ar condicionado está legal. O informativo vai aparecer na hora de chamar a corrida”, disse.
Para o autônomo Algeu Vaz o passageiro não pode conversar com o motorista. “O condutor tem que prestar atenção no trânsito e só dar respostar curtas. Tem que focar no volante e não na conversa. Tenho meu carro e dirijo há 26 anos, quando entram no veículo é bico quieto”, destacou.
Já Elias Goldin de 42 anos relata que se um motorista puxar assunto, responde de boa, mas tudo tem limite. “Falo com eles sem problemas. Mas, tem que prestar atenção, pois se ele cumprimentou e a pessoa não respondeu então esse é o basta, não adianta. No meu caso, quando não quero nada, sento no banco de trás e esse já é um sinal”, frisa.
A vendedora Elizabete Vilas Boas comenta que usa o aplicativo de viagens nos finais de semana e conversa com o motorista para desabafar. “A gente fala como foi o dia, conta o que aconteceu, mas não tudo sobre a nossa vida. Tem dias estressantes, cansativos que as pessoas querem dizer o que houve. Não vejo problema nisso”, disse.
Ela diz que atualmente o que mais falta é simpatia. “Acho que a correria do dia a dia está tornando as pessoas mais duras, rígidas. Trabalho vendas e tem gente que chega e quer conversar, não posso virar as costas e deixar de dar atenção. Acredito que conversar é uma forma de melhorar o momento da pessoa”.
O cozinheiro, Ronilson Mancila trabalha até de madrugada e costuma voltar diariamente para casa de Uber, porém nesse período os motoristas não gostam de falar. “É difícil deles conversarem porque ficam medo de alguma coisa. Quando estão quietos, também me calo e acho que se chegar mesmo a opção de escolher se queremos dialogar ou não, será bom”, disse.
Respeito - Para o montador de móveis, Ronei Pereira quem não gosta de conversar é “de mal com a vida”. “Gosto de falar, isso melhora a viagem. Já teve vezes que o motorista não conversou e ficou chata a situação, mas não dei nota baixa pra ele”, relata. O estudante, Eduardo Anderson conta que usa o aplicativo com pouca frequência, no entanto sempre foi bem recepcionado, com um papo legal.
O estudante analisa que, caso o teste seja aprovado e venha para o Brasil será bom. “Isso vai ajudar. Acho que a comunicação é importante para manter o contato e se sentir mais confortável porque entrar no carro e ficar em silêncio gera um clima ruim”, disse.
João Carlos é consultor comercial e relata que faz corridas pela Uber todos os dias, e toda vez tem que conversar com o motorista, “é bom para distrair ele e a gente”, afirma. Já a atendente de farmácia, Claudiane Andrade conta que passou por uma “saia justa” com um motorista.
“Tem muitas coisas que eles deixam a desejar. Teve uma vez que chamei uma corrida e o carro não tinha ar condicionado. O condutor ainda disse que se não colocasse o cinto teria que descer do veículo, foi mal-educado. Em relação à conversa, tem uns que falam e outros que nem olham pra nossa cara”, conta.
Claudiane aprendeu uma técnica para evitar o mal-estar com o motorista. “Quando entro no carro já cumprimento. A maioria dos motoristas é simpático, mas tem uns que são complicados. E tem situações que não estamos em um dia legal, só queremos chegar em casa, mas falam muito e isso incomoda. Quando não estou disposta, respondo de forma ríspida para a pessoa se tocar”, revela.
Para o motorista da Uber, Alan Cristian a novidade da empresa vai ajudá-lo a identificar se o passageiro é tranquilo ou não, mas a conversa contribui na sua avaliação. “A Uber dá vantagens para motoristas bem avaliados, tem o clube seis estrelas, que traz benefícios e por isso todos querem ter uma boa nota”, explica.
Alan trabalha pelo aplicativo há um mês e comenta que até o momento, não passou por nenhuma situação desagradável durante as corridas. A sua estratégia para saber se o passageiro quer ou não conversar é cumprimentá-lo assim que embarca. “Já teve casos de alguém entrar no carro e dizer que era de boa, não queria ficar ali sem conversar. Tem gente que gosta de dialogar e subtrair um conhecimento da outra”, disse.
Valdevino Florentino também é motorista e, às vezes, passageiro. Ele relata que faz parte do clube seis estrelas e que conseguiu o benefício pela forma de tratar o cliente. “Trabalho e a primeira coisa que faço é identificar a pessoa, cumprimentar e nesse momento dá para perceber se ela quer falar ou não. Se respondeu, dá para fazer as leves perguntinhas, se a música tá boa, se o ar está bom”, conta.
Para ele, mesmo que a viagem seja rápida, mas nenhuma das partes conversam o percurso parece aumentar. “Na situação de meia hora de viagem, se ficar aquele silencio se transforma em oito horas, isso serve para todos. Sou motorista de aplicativo e passageiro também, só de entrar em um veículo já sei como está o psicológico dele. Uso a árvore imaginária, então quando saio de casa deixo os problemas lá”, afirma.
O motorista fala sobre o teste que a Uber está realizando. “Esse sistema vai ajudar porque tem gente que entra no carro do amarelo para o vermelho e qualquer coisa que fizer pode derrubar a sua nota. Já passei por uma situação que a mulher entrou no carro e perguntei se o ar estava bom, ela respondeu ríspida e isso já me fez engessar o pescoço. Sabia que estava do amarelo para o vermelho”, conclui.