Maioria decide colocar Trutis no banco dos réus por fingir ser vítima de ataque
Deputado bolsonarista responderá na Justiça por mobilizar a PF para investigar "atentado fake"
Por maioria, o STF (Supremo Tribunal Federal) colocará o deputado federal bolsonarista, Loester Carlos, o Trutis (PL-MS), no banco dos réus por três crimes cometidos ao mobilizar a Polícia Federal para investigar “atentado fake” do qual supostamente havia sido vítima, em fevereiro de 2020.
A PGR (Procuradoria Geral da República) denunciou o parlamentar por falsa comunicação de crime, porte ilegal e disparo de arma de fogo, em outubro do ano passado, após a longa investigação da PF, acompanhada pela Suprema Corte, uma vez que Trutis tem foro privilegiado.
No dia 5 deste mês, o STF começou a julgar o pedido da acusação e a ministra Rosa Weber, responsável por acompanhar todo o inquérito, votou pelo recebimento da denúncia. O julgamento virtual, que começou no dia 5 de agosto, ainda não terminou. O Pleno do Supremo – formado por 11 ministros – têm até hoje para tomar decisão sobre se o processo contra o deputado continua ou não, mas a maioria já acompanhou o voto da relatora, o que significa que o parlamentar vai ter de responder às acusações na Justiça.
Já votaram a favor da continuidade do processo, os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli e Cármen Lúcia. Para a ministra e os cinco outros magistrados, as provas coletadas pela PF dão suporte à narrativa da denúncia.
O atentado – A suposta emboscada para matar Trutis, da qual ele só teria saído vivo porque, como em um filme de ação, se abaixou dentro do carro onde estava e revidou, “aconteceu” no dia 16 de fevereiro de 2020. Naquele domingo, o deputado publicou no Facebook, por volta das 9h, que ele e sua equipe haviam sofrido um ataque a tiros a caminho de Sidrolândia – distante 70 km de Campo Grande.
“O carro em que estavam foi alvejado por, no mínimo, 5 disparos”, dizia a nota divulgada em rede social de Trutis naquele domingo. A imagem anexada à postagem mostrava um Toyota Corolla preto com vidros estilhaçados e marcas de bala. “O deputado conseguiu revidar o ataque. Apesar da emboscada, todos estão bem e sem ferimentos”, continuava comunicado. Para ir até à PF pedir que o crime fosse investigado, ele recorreu à escolta do Bope (Batalhão de Operações Policiais Especiais).
Desmascarado – Rastreador do carro, câmeras espalhadas pela BR-060, perícia e exaustiva investigação levaram a Polícia Federal a descobrir, contudo, que a suposta emboscada era uma farsa ou, como classificaram os investigadores, uma “tragicomédia com dois atores”: o deputado e seu motorista, Ciro Fidélis. O assessor sustentou a narrativa do chefe ao longo do inquérito policial.
A perícia identificou disparos de pistola Glock 9 mm de fora para dentro do Corolla e disparos de pistola Taurus de dentro para fora do carro. Para a PF, os tiros nas duas direções serviram para justificar a versão do deputado, de que ele revidou ao ataque e por isso, sobreviveu. Mas, de acordo com análise técnica, seria impossível Trutis sair ileso do atentado.
O deputado e Fidélis foram alvos, em 12 de novembro de 2020, da Operação Tracker, que não por acaso significa rastreador em inglês. A PF estava atrás de mais provas para concluir as investigações. O parlamentar acabou preso com armas mantidas em casa sem registro em seu nome. Foi liberado no mesmo dia.
Mas antes de novembro, a equipe da PF já havia descoberto vários detalhes do ocorrido. A PF refez os passos de Loester, afinal ele deveria estar sendo monitorado por quem tinha a intenção de matá-lo ou feri-lo.
O Corolla, alugado com recursos do gabinete do parlamentar, só chegou a Campo Grande um dia antes do atentado. Além de filmagens analisadas, policiais estudaram os dados do GPS do veículo e constaram que o carro não circulou somente pela BR-060, na saída para Sidrolândia, onde teria acontecido a abordagem, mas entrou em estradas vicinais.
Numa das estradas, o carro ficou para “por exatos 40 segundos” também registraram os investigadores, “tempo suficiente para descer do veículo, efetuar vários disparos de arma de fogo e retornar para dentro do veículo”. Foi neste trecho de terra que a PF encontrou jogados estojos de munição 9 milímetros.
Outro lado - A apuração é rica em detalhes, mas Trutis sempre alegou ser vítima de complô “da esquerda” para “assassinar sua reputação”. Por duas vezes, a defesa do parlamentar tentou “trancar” o inquérito, sob o argumento de que as investigações estavam sendo conduzidas de forma irregular e que Trutis era vítima de “descarado abuso de autoridade”, mas os dois pedidos feitos ao Supremo foram negados.
Quando foi denunciado, o parlamentar disse ser vítima de “um refinado conluio de autoridades locais, que induziram o PGR e a ministra a erro” e nesta segunda-feira (15), ainda não se manifestou sobre o assunto.