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Capital

Moradores da periferia questionam projeto de hospital público em área nobre

Quem depende do transporte público, e vive longe do centro, lamenta a futura obra no Chácara Cachoeira

Por Jhefferson Gamarra, Geniffer Valeriano e Antonio Bispo | 02/11/2024 07:28
Moradora do Bairro José Teruel caminhando pelo bairro (Foto: Henrique Kawaminami)
Moradora do Bairro José Teruel caminhando pelo bairro (Foto: Henrique Kawaminami)

A construção do primeiro complexo hospitalar municipal de Campo Grande, anunciada pela prefeitura em julho, tem gerado descontentamento entre os moradores das áreas mais distantes, que criticam a localização escolhida. O hospital foi projetado para o Bairro Chácara Cachoeira, uma das regiões mais nobres da cidade e, embora a promessa de aprimoramento do sistema de saúde tenha gerado expectativa, residentes de bairros periféricos se mostram preocupados com a dificuldade de acesso ao novo hospital, considerado por muitos "fora de mão", especialmente para quem depende do transporte público.

Auxiliar ambiental, Adrieli Ferreira, lamenta a escolha do local de construção (Foto: Henrique Kawaminami)
Auxiliar ambiental, Adrieli Ferreira, lamenta a escolha do local de construção (Foto: Henrique Kawaminami)

RESUMO

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A construção do primeiro complexo hospitalar municipal de Campo Grande, prevista para o bairro Chácara Cachoeira, gerou polêmica entre os moradores, principalmente os que residem em áreas mais distantes. Enquanto a prefeitura destaca a localização estratégica para suprir um vazio assistencial e melhorar a distribuição dos serviços de saúde, moradores de bairros periféricos criticam a dificuldade de acesso ao hospital, situado em uma região nobre da cidade e distante de suas residências, o que dificulta o acesso, principalmente para aqueles que dependem do transporte público.

A auxiliar ambiental Adrieli Ferreira, 30 anos, mãe de três filhos, mora no Residencial José Teruel Filho, destaca as dificuldades de acesso a serviços médicos que já existentes e reforça a dificuldade de acesso ao futuro hospital, que fica a quase 20 quilômetros de distância de sua residência.

“Nossa, é ruim porque é tudo longe, principalmente para quem mora aqui. O hospital é longe, posto 24h é longe. O acesso fica ruim mesmo. Se ele fosse mais centralizado, próximo dos bairros que são maiores, ficaria melhor. A minha filha de 7 anos faz tratamento de vista porque usa óculos com grau sete e para ela receber atendimento tenho que levar em unidade especializada perto do Guanandizão. Tudo é muito longe para a gente que tem que andar de ônibus e não tem carro”, argumentou a moradora.

Alexandrina Martins comenta que distância das unidades de saúde é um empecilho (Foto: Henrique Kawaminami)
Alexandrina Martins comenta que distância das unidades de saúde é um empecilho (Foto: Henrique Kawaminami)

Outro relato que reforça a insatisfação vem da auxiliar de limpeza, Alexandrina Martins dos Santos, 43 anos, que mora na mesma região há mais de uma década. Com dois filhos e uma rotina que inclui o cuidado com a saúde, ela compartilha da insatisfação com a localização do futuro hospital.

“Muito longe. É fora de mão, porque em questão de locomoção, como essa nossa região aqui, você precisa pegar vários ônibus ou gastar com aplicativo, e tudo isso é dinheiro. Quando a minha filha teve meu neto na Santa Casa, precisei dormir no chão lá na frente porque, para ficar indo e vindo, demora muito, e é muito gasto. E com um hospital como esse do outro lado da cidade, continuaria muito longe. O certo seria construir mais unidades 24 horas em várias regiões da cidade para que todo mundo consiga ter acesso a atendimento a qualquer hora”, disse a moradora.

Igualmente insatisfeita, a dona de casa Suzana Margarete Pereira, de 50 anos, residente no Tarumã, lamenta a distância do hospital. Ela vive com o marido, ambos com diabetes e hipertensão, e frequentemente precisam visitar o posto de saúde. “A gente precisa sim do hospital, mas é longe para quem mora para cá. Nós só temos a UBS que fica perto, e para chegar até lá é difícil”, explica.

Mesmo tendo carro, Suzana depende do marido para dirigir, o que só poderia acontecer aos finais de semana. “Nos outros dias, precisaria ir de Uber, porque de ônibus está um caos. Em uma emergência, chegar lá seria muito complicado; já chegaria morta”, brinca. Ela comenta ainda que, quando precisa levar a neta de 2 anos ao posto em situações emergenciais, tem que ir até a UPA Leblon, o que leva cerca de 30 minutos, e que, caso o hospital fosse construído onde está previsto, esse tempo dobraria devido ao trânsito.

Vanessa de Lima lamenta a distância e a falta de transporte público eficaz para chegar ao futuro hospital (Foto: Osmar Daniel)
Vanessa de Lima lamenta a distância e a falta de transporte público eficaz para chegar ao futuro hospital (Foto: Osmar Daniel)

Vanessa de Lima, 24 anos, operadora de produção e mãe de um filho de 2 anos, também se mostrou preocupada com a futura localização do novo hospital. “Deveria ser mais perto. Um Uber à noite custa entre 35 a 36 reais, o que não é viável para a gente que mora aqui”, critica.  Moradora do Jardim Tarumã, ela descreve a UPA do Coophavila, que fica mais próxima de sua residência, como insatisfatória. “É horrível. Especialmente em dias de chuva, parece que chove mais lá dentro do que fora. Eles só pintam a frente, mas o teto tá caindo aos pedaços”, lamenta.

A falta de pediatra próximo também é um problema, que força a moradora a se deslocar até a UPA Leblon, onde ela não consegue ir com facilidade por não ter carro. “Se eu fosse de ônibus até onde será construído o hospital, gastaria pelo menos duas horas e teria que pegar três linhas diferentes. Se for uma consulta cedo, tenho que madrugar no ponto, e se for uma urgência, nem compensa ir”, desabafa. Para ela, a solução seria a construção de um hospital mais centralizado ou melhorias na UPA existente.

Em resposta à reportagem, a Sesau (Secretaria Municipal de Saúde) esclarece que a escolha da localização para a construção do novo Complexo Hospitalar Municipal foi baseada em critérios técnicos, seguindo as diretrizes do SUS (Sistema Único de Saúde). Segundo a secretaria, a área do Bairro Chácara Cachoeira foi estrategicamente selecionada para suprir um vazio assistencial existente na cidade, buscando melhorar a distribuição dos serviços de saúde.

A prefeitura ressaltou que os hospitais públicos atuais, como o HUMAP (Hospital Universitário Maria Aparecida Pedrossian) e o HRMS (Hospital Regional de Mato Grosso do Sul), estão localizados em outras regiões de Campo Grande. Essa concentração de serviços em áreas específicas motivou a decisão de situar o novo complexo hospitalar em uma região que pudesse atender uma parte da população que se desloca atualmente para essas unidades.

Projeto - A construção do hospital será financiado por uma empresa privada que, além de construir o prédio, ficará responsável pela manutenção dos serviços básicos, como segurança e limpeza, por um custo anual de R$ 20 milhões. O contrato de aluguel por 20 anos será uma despesa significativa, mas, ao final desse período, a unidade será incorporada ao patrimônio público da cidade.

O complexo deverá contar com 14.914 metros quadrados de área construída e oferecer uma gama de serviços de saúde, incluindo 259 leitos e 10 salas de cirurgia. A previsão de entrega da obra é para julho de 2026, com um orçamento que envolve um contrato de aluguel de R$ 5 milhões mensais por 20 anos, resultando em um custo total de aproximadamente R$ 2,4 bilhões ao longo das próximas duas décadas.

O hospital contará com quatro pavimentos – subsolo, térreo, primeiro e segundo andares – e oferecerá estacionamento com 225 vagas. Além de uma estrutura moderna, incluindo UTIs pediátrica e adulta, o complexo terá um centro de diagnósticos equipado com tecnologia de ponta para exames como ecocardiogramas e tomografias.

Segundo projeção da prefeitura, o hospital terá capacidade para realizar mensalmente 1.500 internações, 1.000 cirurgias, 2.500 atendimentos de emergência e 13.500 consultas médicas. Com um centro de diagnóstico e 53 consultórios, a unidade também promete oferecer exames de alta complexidade, como ressonância magnética e tomografia. A iniciativa visa absorver a demanda reprimida por diagnósticos e procedimentos cirúrgicos, um problema crônico em Campo Grande.

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