O caminho onde as bananas valem mais que as pessoas
Flaviano Bianchini, um italiano de 34 anos de idade, decidiu jogar fora sua identidade, suas roupas e documentos. Inventou Aymar Blanco, um falso peruano. Saiu da Guatemala percorrendo um dos muitos caminhos da ilegalidade para chegar nos Estados Unidos. Levou 21 dias para atravessar o México. Escondido em trens, em cima de bananas, algumas vezes encarcerado, correndo da polícia em outras, sem dormir quando o corpo exigia o sono, saqueado no caminho. Todo esse esforço para compreender o que verdadeiramente ocorre com os migrantes que tentam chegar nos EUA e escrever um livro.
Bianchini afirma que essa experiência cancela toda a humanidade. A primeira regra é não confiar em ninguém porque pode ser um ladrão, alguém que te entregará às máfias ou, no melhor dos casos, correrá mais que você quando chegar a polícia. Essa é a regra número um do migrante e todos a violam porque é contrária à nossa natureza. Surgem então pequenas alianças, inconstantes e momentâneas, para buscar um refúgio. O outro risco importante é o de gostar dos demais migrantes. Bianchini conta que perderam duas pessoas no caminho, durante a noite. Acredita que eram duas mulheres grávidas, mas não tem certeza pois é melhor não saber, não se envolver.
Nada pode ser feito por quem se perde, não podem voltar atrás para salvar alguém que a escuridão ou a imensidão do deserto faça desaparecer. Os migrantes perdem irmãos, amigos, esposas pelo caminho e seguem adiante. O humano seria parar e ir buscá-los. Mas voltar atrás significa perder-se do grupo, perder-se do guia que não para e ficar vagando sem norte no deserto.
Essa é uma viagem que os humanos fazem junto com as bananas. Os humanos são ilegais, as bananas legalizadas. Os humanos são mortos, as bananas cuidadas com carinho.
Minutemen, os norte americanos que matam migrantes
Um minutemen era um colono norte americano que, de forma independente, se organizava e formava milícias para lutar contra os ingleses na Guerra de Independência dos EUA. Esse nome vem do fato de serem conhecidos por estarem prontos para a batalha "em um minuto".
Hoje, os minutemen são norte americanos brancos que atiram nos migrantes que tentam atravessar as fronteiras. São milícias que iniciam envenenando os raros poços existentes no deserto que separa o México dos Estados Unidos e terminam atirando e matando os "invasores latinos". São eles que deram a base de sustentação para a vitória de Trump.
A morte te espera na fronteira do México com os EUA.
Sásabe é o nome da cidade mexicana. De lá, partem milhares de latinos, e brasileiros, para a conquista do dinheiro norte americano. Fica a algumas horas de Tucson, no Arizona. As ruas são desérticas e esburacadas, cobertas por uma terra arenosa em outras. Assim como inúmeras outras cidades ao longo da fronteira. Não é uma cidade onde as pessoas desejem nascer, crescer e prosperar. É uma cidade de passagem. Um lugarejo para descansar, comprar comida e água.
Ao meio-dia, o sol é de cegar. Depois de anoitecer, o deserto é frio e impiedoso. Sásabe há muito aceitou seu triste destino, sua infeliz localização. A única construção que parece sólida é a cerca que a separa do "paraiso". Mas é pior que o purgatório. E pode piorar. Seu "negócio", a renda das famílias de mexicanos que por lá vivem talvez desapareça com a provável construção do muro que Trump pretende construir.
Em Sásabe só há um escritório minimamente importante. O Grupo Beta fica em uma sede bem próxima à fronteira. Sua missão é pra lá de impossível: convencer os imigrantes latinos a desistirem de seu intento. Mostrar em um mapa as milhares de cruzes onde os corpos latinos foram abandonados à sanha dos ventos desérticos. São três funcionários vestidos com macacões alaranjados para convencer milhares de latinos. Desde 2001, pelo menos 2.600 imigrantes morreram tentando fazer a perigosa travessia.