Só dois vereadores de município não entraram em esquema de “mensalinho”
Relatório aponta que parlamentares forçavam CPIs para pressionar o atual prefeito a beneficiar os envolvidos
Nove dos 11 vereadores da atual legislatura de Ribas do Rio Pardo são investigados pelo Ministério Público por associação criminosa, corrupção passiva e prevaricação.
A denúncia, apresentada em dezembro passado, que desencadeou a “Operação Tangentopoli”, é resultado de uma investigação de três anos conduzida pelo Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado). Além dos vereadores, dois servidores públicos e um ex-prefeito também foram incluídos na denúncia.
Os vereadores denunciados são Álvaro Andrade dos Santos (PSD), Anderson Arry Januário Guimarães (PSDB), Edervania dos Santos Malta (MDB), Isac Bernardo de Araújo (PTB), Luiz Antônio Fernandes Ribeiro (MDB), Paulo Henrique Pereira da Silva (MDB), Rose Pereira (Psol), Sidinei Fontebasse Ferreira (PSC) e Tiago Gomes de Oliveira (PSDB), todos seguem atuando na Câmara Municipal.
Apenas a vereadora Tânia Maria Ferreira Dias (Solidariedade) e o vereador Christoffer Jamesson da Silva (PSC), o “Policial Christoffer”, não foram citados na nota oficial divulgada pela assessoria de imprensa do órgão.
Segundo o documento, as investigações revelaram que, durante a gestão anterior do prefeito Paulo Tucura, esses vereadores buscavam receber pagamentos mensais em troca de aprovação de projetos do Poder Executivo, conhecido como "mensalinho". A prática teria se estendido para a atual administração, onde os legisladores articulavam CPIs (Comissões Parlamentares de Inquérito) sem fundamentos para pressionar o atual prefeito João Alfredo Danieze (PT) a efetuar os pagamentos.
A denúncia ainda destaca que, mesmo com CPIs baseadas em argumentos frágeis, arquivadas ou suspensas pelo Poder Judiciário, a pressão por propina continuava. Os promotores observaram que os vereadores utilizavam as funções políticas e parlamentares para negociar futuras votações e cargos, ameaçando constantemente o prefeito com a possibilidade de cassação do mandato.
“Apurou-se que um dos meios utilizados para pressionar o Prefeito Municipal João Alfredo Danieze a conceder cargos a vereadores ou seus aliados, bem como a efetuar pagamento de propina mensal, foi o uso indevido da atividade política e parlamentar para negociar aberturas ou votações futuras em Comissões Parlamentares Processantes ou de Inquérito porventura instaladas, fazendo pesar a espada de Dâmocles por sobre o Chefe do Executivo, com ameaça constante de cassação do mandato”, diz a denúncia.
O Gaeco aponta que os vereadores Álvaro Andrade, conhecido como "Nego da Borracharia", Anderson Arry e Tiago do Zico contavam com o auxílio do ex-prefeito José Domingues Ramos (PSDB), o "Zé Cabelo", para articular a cassação do prefeito João Alfredo. O grupo também teria corrompido outros envolvidos no esquema, conforme as investigações.
Em um áudio captado em 15 de setembro de 2022, Nego da Borracharia conversa com servidor sobre a CPI instaurada contra o prefeito João Alfredo. Na gravação, o vereador admite a natureza política da cassação, lamentando a mudança de posicionamento de alguns colegas de parlamento.
A reportagem enviou e-mail à Câmara de Municipal de Ribas do Rio Pardo em busca de uma resposta oficial dos vereadores citados, mas até a publicação da matéria não houve retorno.
Operação “Tangentopoli” – Em agosto de 2023, o MPMS (Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul), por meio do Gaeco e da Promotoria de Justiça de Ribas do Rio Pardo, realizou a Operação "Tangentopoli" para cumprir oito mandados de busca e apreensão em Campo Grande e Ribas do Rio Pardo.
A investigação identificou a associação criminosa envolvendo vereadores e pessoas ligadas a eles, focada em corrupção e delitos. Como citado na denúncia, alguns vereadores solicitavam vantagens indevidas para consolidar uma base partidária e aprovar projetos de interesse do Prefeito Municipal na Câmara de Ribas do Rio Pardo, inclusive arquivando comissões parlamentares que investigavam crimes de responsabilidade.
Durante as buscas, mais de R$ 88 mil foram encontrados na casa do vereador Tiago do Zico. À época, o parlamentar saiu da Câmara acompanhado de advogado e não quis conversar com a reportagem.
Já o vereador Nego da Borracharia, apontado como o principal articulador do esquema de propina, conversou com o Campo Grande News na frente da Casa de Leis de Ribas e informou desconhecer o motivo da operação. Álvaro teve computador, celular e documentos apreendidos no gabinete da Câmara.
"Colaborei e passei a senha para eles, mas não tem equívoco, nada de errado, ao contrário, eu falei que almejava a vinda deles aqui há algum tempo, fiz inúmeras denúncias no Ministério Público", disse à época.
O ex-prefeito José Domingues Ramos (PSDB), o "Zé Cabelo", chegou a ser ao ser flagrado com 32 munições, durante mandado de busca e apreensão na operação, no entanto, ele prestou depoimento à Polícia Civil e foi liberado após pagamento de R$ 7,5 mil em fiança. Ele argumentou na delegacia que tinha as munições em casa porque já foi policial civil. Ao deixar a delegacia, acompanhado do advogado, Zé Cabelo afirmou que não iria se pronunciar sobre a operação.
O nome da operação remete ao escândalo de corrupção em Milão, Itália, conhecido como "tangentopoli" (cidade das propinas), fazendo referência à combinação de "tangente" (propina) e "poli" (cidade).
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