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Cidades

Com 16 feminicídios, Agosto Lilás evidencia desafio de conter violência

Durante a abertura, envolvidas com atenção a vítimas apontam a dificuldade de superar violência doméstica

Geniffer Valeriano | 01/08/2023 14:00
Valéria Carrilho (na esquerda) e Maurília Sartori (na direita) foram as últimas duas vítimas de feminicídio (Foto: Reprodução)
Valéria Carrilho (na esquerda) e Maurília Sartori (na direita) foram as últimas duas vítimas de feminicídio (Foto: Reprodução)

Nesta manhã, foi lançada a campanha do Agosto Lilás em Campo Grande, com a exposição da dificuldade de avançar no combate à violência contra a mulher. O debate reuniu cerca de 55 gestoras de Políticas Públicas para Mulheres de todo o Estado. O encontro termina amanhã. Este ano o tema da campanha é: “Ignorar faz de você cúmplice desse crime”.

Entre janeiro e julho deste ano, foram registrados 16 casos de feminicídio, desses cinco ocorreram em Campo Grande. Na Capital, apenas nos meses de março e maio, não houve nenhum registro, em contrapartida, em todos os outros meses houve uma ocorrência do crime contra mulheres. Na faixa da fronteira do Estado, a situação é semelhante; lá, só nos meses de fevereiro e junho não houve registro de feminicídios. Nos outros meses, houve registro de um caso e em julho foram quatro ocorrências.

Os casos de violência doméstica totalizam 11.201 ocorrências somente nestes primeiros sete meses do ano, conforme o site da Sejusp (Secretária de Estado de Justiça e Segurança Pública). O maior número de casos foi registrado logo no início de 2023, em janeiro.

Antes de iniciar os debates, houve encenação impactante contando a história de duas mulheres vítimas de feminicídios. Uma das histórias interpretadas foi a de Maiara Amaral, musicista que tinha somente 27 anos quando foi assassinada em 2017, em Campo Grande. Em uma parte da apresentação, as vítimas gritavam por socorro para a plateia e o silêncio predominava. Em seguida, as atrizes em voz alta afirmaram: “o silêncio também é o culpado”.

Para compor o evento foram chamadas autoridades que atuam na área, como promotora de justiça, delegada titular da Deam (Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher). A primeira-dama do Estado, Mônica Riedel, também participou.

Somando aproximadamente 419 mil vítimas de violência doméstica em todo Mato Grosso do Sul, no período de 2016 a 2020, a subsecretária estadual de Políticas Públicas para Mulheres, Cristiane S’antana Oliveira, afirma que, além do governo, a sociedade também precisa ser envolvida.

Abertura do evento contou com encenação de duas histórias de vítimas de feminicídio (Foto: Paulo Francis)
Abertura do evento contou com encenação de duas histórias de vítimas de feminicídio (Foto: Paulo Francis)

“Você pode não estar vivendo a situação de violência, mas conhece alguém, na nossa família, círculo de amigos, no círculo de quem trabalha conosco e nós não podemos ignorar. Então todos nós podemos de alguma forma acolher a mulher em situação de violência, conhecer um canal como 180, para poder denunciar, os equipamentos sociais que há na cidade, como os centros de atendimento e delegacias da mulher, os CREAS ou CRAS. São equipamentos que estão à disposição de qualquer pessoa da sociedade para procurar apoio, fazer a denúncia e ser acolhida”, pontuou Cristiane.

A subsecretária ainda afirmou que nos últimos anos houve um aumento do número de notificações recebidas de violência contra mulheres. Ela atribui isso à confiança da mulher de que a sua denúncia trará consequências para o agressor. No evento, foi apontado que um perfil frequente nas agressões é de homens que não aceitam o fim do relacionamento.

A porcentagem de violência contra as mulheres inicia dentro de casa. Então, a dificuldade de terminar um relacionamento, e daí se parte de uma concepção de que o corpo da mulher é sua propriedade e de que 'se não é comigo, não vai ser com ninguém mais'. Por isso precisamos investir muito na educação de respeito, na narrativa de que homens e mulheres precisam ter igualdade na sociedade para que a gente possa avançar”, explicou.

Quando questionada sobre como a presença da violência doméstica pode afetar crianças e adolescentes, Cristiane defende que no futuro esse filho pode se tornar um combatente da agressão. Em contrapartida, a realidade também mostra que na fase adulta uma criança que presenciou a violência doméstica pode repetir as agressões ao longo de sua vida.

Tendo isso em mente, a gestora de políticas públicas da cidade de Bataguassu, Loti Alves Meira, conta que durante as campanhas levará palestras abordando o tema para as escolas e igrejas. “Pensando na geração futura temos que preparar os homens, não só adultos, temos que preparar os adolescente de alguma maneira”, disse.

Em Bataguassu, a DAM (Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher) está em funcionamento há pouco mais de um ano e somente recentemente começou a funcionar 24 horas por dia. Com dificuldades para conseguir implementar políticas públicas para esta área, Loti afirma que às vezes sente que está “enxugando gelo”, mas tem esperança de que a situação melhore.

Na cidade de Loti, as ocorrências de agressões são registradas principalmente nos finais de semana. Ela associa essa situação ao fato de que os parceiros das vítimas aproveitam o sábado e o domingo para ir a festas e acabam se embebedando. Por estarem alcoolizados, acabam se desentendendo com as companheiras e passam a agredi-las.

Gestora de políticas públicas da cidade de Bataguassu, Loti Alves Meira (Foto: Paulo Francis)
Gestora de políticas públicas da cidade de Bataguassu, Loti Alves Meira (Foto: Paulo Francis)

Encontrando muitas vítimas com medo de denunciar o agressor, a gestora relata que há necessidade de se criar um local para abrigar essas mulheres. “Não temos um lugar, aí eu tento conseguir uma vaga em um hotel super reservado que ela pode ficar três dias e após? Eu não sei para onde mando essa mulher, tiro ela da cidade? Não sei pra onde levo. Então elas já têm medo e é uma dificuldade grande fazer políticas públicas”.

O mesmo medo foi verificado na região da fronteira com o Paraguai, na cidade de Coronel Sapucaia. A coordenadora de políticas públicas para mulheres, Cleia Mascarenhas, contou que o receio parte da facilidade que os agressores encontram para se refugiarem no país vizinho.

“O nosso maior desafio é justamente por ser fronteira, né? Então o que acontece é que o agressor pratica violência aqui no Brasil, e por ser uma fronteira seca, ele cruza e já está protegido no outro país. Nós temos no nosso município a cooperação entre as polícias, então se precisar fazer uma busca ou perseguição a polícia entra, mas fora isso a polícia não vai fazer a busca lá no outro país, então justamente a fronteira é o maior desafio”, pontuou.

Sem ter uma delegacia com atendimento especializado para mulheres em sua cidade, a coordenadora explica que trabalham com a orientação da população através do CREA (Centro de Referência Especializado de Assistência Social).

Mesa diretória do evento foi formada somente por mulheres (Foto: Paulo Francis)
Mesa diretória do evento foi formada somente por mulheres (Foto: Paulo Francis)

Denuncie - O Ligue 180 é um canal de atendimento à mulher que funciona 24 horas por dia, é gratuito e confidencial. É possível enviar denúncias e esclarecer dúvidas sobre os diferentes tipos de violência aos quais as mulheres estão sujeitas.

Também é possível acionar o Disque Direitos Humanos, pelo número 100. Nos casos em que a vítima está em perigo iminente, é recomendado acionar a Polícia Militar pelo 190.

Mesmo se a vítima não registrar ocorrência, vizinhos, amigos, parentes ou desconhecidos também podem utilizar o Ligue 180 ou ir a uma delegacia para denunciar a agressão que tenham presenciado.

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