Sem provas, nem prisões: um ano após chacina, caso deve ser arquivado
No dia 19 de outubro do ano passado, moradores de Paranhos, município distante 469 quilômetros de Campo Grande e que tem pouco mais de 13 mil habitantes, viveram um misto de pavor e tristeza.
Cinco pessoas foram mortas e outras três ficaram feridas em uma chacina na Rua Marechal Deodoro, em frente à Padaria Bahamas, no Centro. Elas foram vítimas de pouco mais de 100 disparos de fuzil e pistola. Um boato de que aqueles não seriam os únicos alvos e que outros atentados estariam "programados" se instalou e gerou terror na cidade.
Das cinco vítimas fatais, Bruno Vieira de Oliveira, de 26 anos, morava em Paranhos. Mohamed Youssef Neto, de 31 anos, residia em Minas Gerais, enquanto Arnaldo Andres Alderete Peralta, 32 anos e Rodrigo da Silva,28, eram moradores de Ypejhú, cidade paraguaia, que faz fronteira com Mato Grosso do Sul. A Polícia não informou oficialmente onde morava Denis Gustavo,24 anos.
Hoje, exatamente um ano depois do ocorrido, a população ainda vive uma rotina de medo. A polícia não encerrou o inquérito que investiga as mortes, ninguém foi preso, não há suspeitos, nem a motivação real do crime. O caso deve ser arquivado por falta de provas.
Conforme o delegado da Polícia Civil, Fabrício Dias dos Santos, responsável pelas investigações, no local do crime foram apreendidos 97 projéteis de fuzil e sete de pistola calibre nove milímetros, além de objetos das vítimas, três carros e uma moto, para a realização de perícia.
Mesmo depois de ouvir dezenas de pessoas, a polícia ainda não sabe a motivação e não tem suspeitos sobre a autoria do crime, registrado como homicídio doloso. “Na fronteira a realidade é muito complicado. As testemunhas têm medo de falar o que viram, os familiares também não dizem o que sabe. A lei do silêncio impera e não conseguimos provas de nada”, explicou o delegado.
Guerra do narcotráfico – Apesar da falta de informação, uma das linhas de investigação da polícia é a ligação das mortes com o narcotráfico.A bordo de duas caminhonetes de cor preta, provavelmente modelo Hillux, bandidos teriam feito pelo menos 100 disparos no Centro de Paranhos. Em uma ação rápida, que durou cerca de dois minutos, os bandidos acertaram a todos que estavam por lá.
Tudo levar a crer que a chacina é mais um episódio na guerra pelo controle do tráfico de drogas na região. Estes confrontos resultaram em várias mortes em Ponta Porã e Pedro Juan Caballero.
Na época em que ocorreu o crime, um boato que circulo na cidade era de que uma das vítimas seria um dos líderes do tráfico de drogas na cidade, que faz fronteira seca com Ypehú, no Paraguai. “Investigamos a questão do tráfico porque estamos na fronteira e é uma região comum a isso, mas, por enquanto, não conseguimos confirmar nada disso”, disse o delegado.
Lista da morte – Enquanto nada se revolve no campo da Justiça, o prefeito do município Julio Cesar de Souza, diz que a população ainda está assustada com a situação. “Aqui não mudou nada com relação à segurança. O Governo fez um plano paliativo na época, mas agora o efetivo continua o mesmo. Não temos policiais, não temos delegado, nem gasolina temos, e isso para dar conta da segurança de uma cidade que faz fronteira com o Paraguai. Nós sentimos completamente abandonados”, afirma o prefeito.
Além do trauma da tragédia, a população em Paranhos convive com o medo. Desde que a chacina ocorreu, um boato de que "mais gente pode morrer" tem causado pânico entre os moradores.
“Aos poucos fomos nos acostumando, mas sempre que alguém é morto aqui, o que não é difícil, ficamos com medo de sair na rua. Mesmo que você não tenha nada a ver com crime, tráfico, fica com medo de ser o próximo. É horrível”, disse uma estudante de 25 anos, que mora na cidade, mas por medo prefere não se identificar.
A polícia diz que a história da lista é uma lenda, que não houve nenhuma denúncia formal sobre isso, portanto nem foi investigada, e que as mortes ocorridas depois da chacina não tem relação com a chacina.
Com boatos atrapalhando as investigações, testemunhas em silêncio e sem provas, a polícia diz que não consegue concluir as investigações e se vê a ponto de arquivar o caso. “Ainda estamos em diligências, ouvindo algumas pessoas, mas caso não encontremos nada, em breve vamos encaminhar o inquérito à justiça com sugestão de arquivamento”, finalizou o delegado.
Vingança – Sem que a polícia sequer identifique os culpados, na cidade, outro boate é de que estejam fazendo justiça com as próprias mãos.
Em fevereiro deste ano, Saturnino Enciso tavares, de 39 anos, foi executado com 5 tiros em frente à uma marcenaria, também no Centro da cidade. Moradores da região afirmam que o a morte tem ligação com chacina ocorrida em outubro.
De acordo com o boletim de ocorrência, um irmão da vítima disse à polícia que uma motocicleta de cor preta, modelo alto, sem placas, se aproximou dele e da vítima enquanto ambos estavam em frente ao estabelecimento. Saturnino, conhecido como Preto, havia acabado de descer da caminhonete onde estava e foi abordado pelo autor dos disparos, que o chamou pelo apelido.
Vingança também seria o motivo da execução do policia civil Aquiles Chiquin Júnior, de 34 anos, ocorrida em junho. Segundo fonte da Segurança Pública, na região, duas quadrilhas disputam o comando do tráfico e em outubro, o grupo do irmão de Aquiles Chiquin Júnior atacou o bando, que seria comandado por um homem conhecido na região como Zacarias, um dos chefões do tráfico por lá.
Entre os cinco mortos na chacina, estaria o filho mais velho do chefão do tráfico. E o mais novo foi socorrido mas, em função da gravidade dos ferimentos, teve uma das penas amputadas. Em retaliação, a quadrilha, Zacarias teria dado o troco na mesma moeda, executando o irmão do integrante da facção adversária.
No início deste mês, o brasileiro Sanderson Carniatto Porto, 41, foi alvo de atentado a tiros em Pedro Juan Caballero, no Paraguai. Morador em Amambai, Sanderson foi alvejado com seis tiros de fuzil AK-47 em frente a uma casa de câmbio na área central de Pedro Juan Caballero.
Alguns minutos após os tiros, Sanderson ligou a caminhonete e dirigiu por 3 km até chegar ao hospital da Cassems em Ponta Porã, onde desceu sozinho e foi até a recepção pedir socorro. Ele estava junto com um homem chamado Eduardo Volpato, que não teria sido ferido e desceu do veículo antes de Sanderson chegar ao hospital.
De acordo com fontes da Segurança Pública ouvidas pelo Campo Grande News, o caso também teria ligação com a chacina de outubro.