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Meio Ambiente

“Rastro de destruição” de barragem em Corumbá levaria lama por 16 km

Dado consta em simulação realizada pela Vale referente à barragem de Gregório; unidade da Vetorial causaria danos ao longo de 7 quilômetros

Ângela Kempfer | 03/02/2019 12:19
Barragem Gregório não opera com sua capacidade máxima. (Foto: Paulo Francis)
Barragem Gregório não opera com sua capacidade máxima. (Foto: Paulo Francis)

O rompimento das barragens de alto potencial situadas no complexo do Urucum, em Corumbá –a 419 km de Campo Grande–, não carrearia a lama com rejeitos de minério e manganês para a cidade ou para o rio Paraguai. Ambos estão distantes a, pelo menos, 40 quilômetros desses depósitos a céu aberto, que não são fiscalizados com critério pelos órgãos federais e podem tanto afetar uma comunidade tradicional como varrer um ambiente de rica biodiversidade do Pantanal.

No caso de duas barragens que apresentam maior risco pelo impacto que causariam –a Gregório, da Vale, na Morraria Santa Cruz, e a Laís, da Vetorial, no Urucum–, a devastação ambiental seria de grandes proporções, atingindo áreas do bioma, na região do Jacadigo, e córregos de água cristalina do manancial subterrâneo que aflora na morraria. No caminho da lama vivem hoje pequenos sitiantes, em um total de 70 pessoas.

Em ambas as situações, as simulações realizadas pelas mineradoras com ajuda de computadores, em caso de um acidente, indicam que um desastre de proporções gigantescas não está descartado: dependerá do pulso de inundação da região pantaneira. No período de cheia, a lama poderia ser arrastada e atingir baias que se interligam e são berçários da ictioufauna. Mas cair no rio Paraguai é uma possibilidade remota, descartada.

Rota de destruição – A operação das barragens é acompanhada desde 2016 pelo PF (Ministério Público Federal) e algumas medidas judiciais e recomendações serão determinadas, adiantou a procuradora da República em Corumbá, Maria Olívia Pessoni Junqueira, que presenciou a última vistoria. A ausência do Ibama e da ANM (Agência Nacional de Mineração) nessa inspeção, como responsáveis pela fiscalização, está sendo questionada.

Técnicos da Vale explicam monitoramento do nível de água na Gregório. (Foto: Paulo Francis)
Técnicos da Vale explicam monitoramento do nível de água na Gregório. (Foto: Paulo Francis)

A Barragem Gregório tem capacidade para 9 milhões de metros cúbicos de rejeitos –a de Brumadinho (MG) era de 12 milhões de metros cúbicos–, está situada no topo de um grande vale, entre tantos que circundam a morraria de vegetação nativa. O desmoronamento de seus 34 metros de altura causaria uma pressão desproporcional, empurrando a lama de rejeitos por 16 quilômetros, informam estudos realizados pela Vale, chegando à rodovia BR-262.

No caminho, a lama se concentraria no córrego Piraputangas, um dos principais da região, e atingiria três balneários –Lago Azul, Menk e Iracema–, passando pela portaria da mina a uma altura de 1,80 metros até se concentrar na BR-262, com pouco mais de três centímetros. O Parque Municipal de Piraputangas, cortado por um braço do córrego, também seria atingido. Com 1.930 hectares, abriga 94 espécies entre flora e fauna, com destaque para 39 plantas, 25 mamíferos e 13 répteis.

Moradores aflitos – Na explanação do plano de emergência apresentado ao grupo de trabalho do Imasul, que vistoriou as barragens no dia 30 de janeiro, técnicos da Vale afirmaram que “o pior cenário”, depois da cheia, seria um incidente num fim de semana. No sábado e domingo, os balneários lotam, triplicando o número de pessoas (200) que vivem na região. A lama não atingiria, no entanto, a comunidade do distrito de Maria Coelho, onde funciona uma escola.

Considerando a pulsação de inundação, essa “mancha” ganharia mais força, pela posição dos vales e depressões na planície, e formaria um corredor que se confrontará com a BR-262 (km 736) no trevo com a BR-454 (acesso ao Jacadigo e Forte Coimbra), passando pela Ferrovia Malha Oeste e a fazenda do empresário Alfredo Zamlutti, em uma região de rica fauna e flora, água abundante e criação de gado.

Barragem Laís, da Vetorial, está no limite de sua capacidade. (Foto: Paulo Francis)
Barragem Laís, da Vetorial, está no limite de sua capacidade. (Foto: Paulo Francis)

Situada mais abaixo da morraria do Urucum, a Barragem Laís também causaria danos irreparáveis por sete quilômetros. A lama atingiria 12 residências (50 pessoas), vales com biodiversidade rica, os córregos Urucum e Arigolândia e também chegaria à BR-262, com possibilidade de contaminar uma das baias do Jacadigo, ao sul da rodovia. A barragem está no limite de sua capacidade –800 mil metros cúbicos– e será elevada a 1,09 milhão de metros cúbicos.

Para quem vive na rota da mancha, os desastres humano e ambiental de grande magnitude causados pelas barragens de Mariana (MG) e Brumadinho deixaram os moradores em alerta permanente. Apesar do monitoramento 24 horas da Gregório, atestada pela Vale, a comunidade tradicional vive em pesadelo com o noticiário. A empresa mantém os moradores em treinamento em caso de emergência, porém eles temem perder tudo.

Alarme falhou – “A gente dorme de olho aberto, desconfiado desse monstro que fica lá em cima”, diz o presidente da associação de moradores, Jeison Corrêa de Oliveira. Ele afirma que a Vale dá atenção à comunidade, realiza visitas às barragens e faz reuniões de orientação, no entanto, a Vetorial é ausente.

“A Vetorial nunca realizou um treinamento com a gente, só faz contaminar nossos córregos, e ninguém toma providências”, acusa Jeison.

Durante a vistoria do Imasul, a Vale apresentou um plano de evacuação dos moradores e funcionários, que inclui todos os procedimentos para situações de emergência e distribuição de cartilhas de orientação sobre as rotas de fugas, todas sinalizadas. No entanto, numa simulação realizada em novembro passado, o sistema de alarme (sirenes) da Barragem de Gregório não foi ouvido em alguns locais a 70 decibéis.

A Vetorial parece ser um caso à parte. Além do fato de não dar atenção aos moradores que podem ser atingidos por um acidente das barragens Laís e Monjolinho, está na mira do Ministério Público Federal e dos órgãos estaduais de fiscalização por descumprimento de normas. A vistoria em suas unidades revelou problemas estruturais preocupantes e a falta de um plano de atendimento emergencial aos moradores. A empresa prometeu se ajustar.

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