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Capital

Oficial dormirá entre jurados para evitar debate sobre execução por engano

Juiz conta detalhes dos bastidores para garantir que júri popular contra Jamil Name Filho não seja anulado

Anahi Zurutuza | 09/06/2023 11:30
Julgamento que durou dois dias em 2021. (Foto: Marcos Maluf/Arquivo)
Julgamento que durou dois dias em 2021. (Foto: Marcos Maluf/Arquivo)

Era uma noite fria em 2021 e depois que o juiz Aluízio Pereira dos Santos decidiu adiar para o dia seguinte júri popular de seis réus acusados de decapitar homem durante um dos chamados “tribunais do crime”, jurados foram levados para um hotel de Campo Grande. Durante um julgamento, a incomunicabilidade dos 7 integrantes do conselho de sentença durante é regra e para garantir que eles não trocassem opiniões sobre o caso, entre a noite do dia 30 de junho e a manhã do dia 1º de julho daquele ano, oficiais de justiça tiveram de dormir “no meio” dos cidadãos.

A cena deve se repetir no próximo mês, quando por quatro dias, os escolhidos pela Justiça como representantes da sociedade para julgar Jamil Name Filho, o Jamilzinho, e outros dois acusados de participar da execução por engano do acadêmico de Direito, Matheus Coutinho Xavier, vão analisar provas, ouvir depoimentos de 13 testemunhas, além de ponderar os argumentos da acusação e das defesas dos réus. O júri popular está marcado para acontecer entre os dias 17 e 20 de julho.

Os jurados se debruçarão sobre o processo para decidir se Name Filho foi ou não responsável por tirar a vida do estudante e definir como foram as participações na trama do ex-guarda municipal Marcelo Rios e do policial civil aposentado, Vladenilson Daniel Olmedo, conhecido como Vlad.

Aluízio Pereira dos Santos, juiz titular da 2ª Vara do Tribunal do Júri de Campo Grande, em entrevista para o Campo Grande News. (Foto: Paulo Francis)
Aluízio Pereira dos Santos, juiz titular da 2ª Vara do Tribunal do Júri de Campo Grande, em entrevista para o Campo Grande News. (Foto: Paulo Francis)

Horas a fio – Acusação e defesa terão um total de 9 horas só para debater o caso, apresentando as alegações aos integrantes do conselho de sentença. Os debates, contudo, começam após os depoimentos de testemunhas e estimativa do juiz é que essa primeira fase leve pelo menos dois dias.

Para evitar o desgaste dos depoentes, Pereira dos Santos escalonou as convocações. Exigir que todos estivessem no Fórum às 8h do dia 17 de julho seria “falta de sensatez”, explicou o magistrado em despacho no dia 24 de maio. “Não é justo que todas as 13 testemunhas sejam intimadas para o mesmo horário, como ocorre de praxe nas audiências em geral, até porque correr-se-á o sério risco de ficarem o dia todo neste Fórum e não serem ouvidas, postergando os seus depoimentos para o próximo dia e assim sucessivamente até que sejam inquiridas”.

Desta maneira, o magistrado mandou que os depoentes sejam intimados a ficar de sobreaviso, para comparecer ao plenário caso haja alguma antecipação, mas, na manhã do dia 17, serão ouvidas três testemunha de acusação e à tarde, outras três, incluindo o pai de Matheus, ex-policial militar Paulo Roberto Teixeira Xavier, o “PX”, para quem estavam “encomendados” os tiros de fuzil AK-47 que atingiram o jovem, segundo a denúncia.

Para o dia seguinte, estão marcados os depoimentos de outras sete pessoas, chamadas pelas defesas de Jamilzinho, Rios e Olmedo. Depois dos interrogatórios dos três réus é que acusação e defesa começam a disputa pelo convencimento dos jurados, provavelmente, só no terceiro dia.

Espaço destinado aos jurados num dos plenários do Tribunal do Júri em Campo Grande. (Foto: Campo Grande News/Arquivo)
Espaço destinado aos jurados num dos plenários do Tribunal do Júri em Campo Grande. (Foto: Campo Grande News/Arquivo)

Silêncio – Durante o tempo que durar o júri, Aluízio Pereira dos Santos precisa garantir que os jurados não debatam o caso entre si e nem com pessoas de fora, sob pena do julgamento ser anulado. “O sigilo das votações impõe o dever de silêncio (a regra da incomunicabilidade) entre os jurados, de modo a impedir que qualquer um deles possa influir no ânimo e no espírito dos demais, para fins da formação do convencimento acerca das questões de fato e de direito em julgamento”, escreve o jurista Eugênio Pacelli, no livro Curso de Processo Penal.

Por isso, o tempo todo, até na hora de dormir, eles são “vigiados” por oficiais de justiça, detalhe também demandará esforço extra em logística durante o júri de Jamilzinho.

O juiz mandou reservar hotel para os julgadores, oficiais e os policiais empenhados na segurança de todos eles. Transporte e alimentação também ficam por conta do Judiciário, mas o magistrado ainda não tem estimativa do gasto.

Pereira dos Santos destaca quão grande é a responsabilidade dos cidadãos convocados para serem os “juízes” do caso. Cada um deles representará cerca de 130 mil outras pessoas, considerando que são sete jurados e a Capital conta com 942 mil habitantes, conforme o Censo 2023. O magistrado lembra que é preciso deixar convicções religiosas e paixões de lado para fazer julgamento justo.

Os jurados não podem, por exemplo, usar o celular e acessar notícias durante o júri, também para não serem influenciados pela repercussão. O magistrado, contudo, explica que pelo “bom senso” deve permitir ligações para a família ao término de cada dia de julgamento, embora as conversar tenham de ser monitoradas.

Para evitar que alguém faça parte do conselho de sentença a contragosto, são convocadas 25 pessoas e 18 acabam dispensadas do trabalho. “Tenho costume de perguntar quem gostaria de participar e dispenso quem não quer de jeito nenhum. Também quem tem problemas de saúde ou alguma questão familiar, quem tem criança pequena, é autônomo ou comissionado e terá prejuízo financeiro se passar quatro dias sem trabalhar”.

Acusação e defesa também têm direito de fazer dispensas e esse momento faz parte do “xadrez” antes do longo caminho até o veredicto.

Caminhonete que era usada por Matheus Xavier no dia em que foi morto a tiros. (Foto: Paulo Francis/Arquivo)
Caminhonete que era usada por Matheus Xavier no dia em que foi morto a tiros. (Foto: Paulo Francis/Arquivo)

O crime – Conforme a tese do MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul), o acadêmico de Direito foi vítima de atentando que teria como alvo o pai. A investigação da Polícia Civil apurou que Xavier era desafeto do grupo comandado por Jamil Name, o “Velho”, e Jamilzinho.

O atentado aconteceu por volta das 18h do dia 9 de abril de 2019, uma terça-feira, na frente de casa de Paulo e Matheus Xavier, no Jardim Bela Vista, bairro nobre da Capital. A investigação apurou que o jovem foi morto por engano, pois estava manobrando o carro do pai. O rapaz foi atingido com sete tiros e o disparo fatal foi na base do crânio.

Jamil Name teve o nome excluído do processo depois de sua morte, em maio de 2020, vítima de covid-19. O processo foi desmembrado para outros dois réus, por estarem foragidos: José Moreira Freire, o “Zezinho”, e Juanil Miranda Lima.

Os dois, segundo a acusação, seriam os pistoleiros, responsáveis pela execução. “Zezinho”, que foi morto em troca de tiros com a Polícia Militar em Mossoró (RN), em dezembro de 2020, também teve nome excluído.

Juanil Miranda ainda está foragido e, neste caso, a Justiça determinou a suspensão dos trâmites até que ele seja recapturado.

Desaforamento – O júri de Jamilzinho e companhia só não acontecerá em julho se o Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul aceitar o pedido de desaforamento (transferência de foro) feito pela defesa de Name Filho, no dia 1º de junho. Para convencer o TJMS a “levar” o primeiro júri para fora de Campo Grande, os advogados alegam que o cliente entrará no Fórum da Capital “já condenado” e “indisfarçável ódio” por parte da sociedade campo-grandense contra a família Name.

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