Cheques de Zeca do PT e ex-presidente do TJ são achados no quarto de Name
Material foi apreendido na sexta-feira pela força-tarefa que coletava provas sobre grupo de extermínio e mortes encomendadas
A ofensiva formada por Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado), Polícia Militar e Polícia Civil encontrou cheques em nome do ex-governador José Orcírio Miranda dos Santos, o Zeca do PT, e do ex-presidente do TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul), Joenildo de Sousa Chaves, durante cumprimento de mandados de busca e apreensão na sexta-feira (27).
Os documentos somam R$ 200 mil e estavam no quarto do empresário Jamil Name, preso no mesmo dia por suspeita de chefiar milícia responsável por assassinatos.
Conforme auto de busca e apreensão, os agentes recolheram cheque do Banco do Brasil em nome do ex-governador, ex-deputado federal e ex-vereador por Campo Grande, Zeca do PT, no valor de R$ 100 mil.
O documento de pagamento em nome do desembargador aposentado Joenildo Chaves, que presidiu o TJMS por 18 meses até se aposentar em 2014, tinha valor igual, mas expedido pelo Banco Bradesco.
Ainda foram apreendidos no quarto de Jamil Name uma fita de gravação, canhoto de talão de cheques, folhas avulsas e nota promissória emitida por “João J. Neto” no valor de R$ 150 mil. O emitente seria o médico cardiologista João Jazbik Neto, que inclusive foi até a casa de Name durante ação policial na manhã de sexta-feira para “prestar assistência”.
No closet e no quarto de orações do empresário, os agentes encontraram mais folhas avulsas, uma carta manuscrita e um caderno “capa com flores” com diversas anotações.
As cópias dos produtos da apreensão estão em sigilo absoluto. Em despacho, o juiz da 7ª Vara Criminal de Campo Grande, Marcelo Ivo de Oliveira, determinou que os documentos permaneçam omitidos, “embora noticie a ocorrência de um outro crime que, aparentemente, não está intimamente ligado aos crimes noticiados nesta representação e envolve pessoas que possuem o foro especial por prerrogativa de função”.
Ainda assim, o magistrado atendeu pedido do Gaeco e encaminhou cópias dos documentos ao atual presidente do TJMS, desembargador Paschoal Carmello Leandro, “para conhecimento e eventuais providências”. Segundo ofício, as peças podem ser encaminhadas ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) e/ou ao STF (Supremo Tribunal Federal).
Decreto – O procedimento de investigação do Gaeco contra a suposta milícia chefiada por Jamil Name e Jamil Name Filho traz em anexo uma série de reportagens sobre exploração de jogos de azar em Mato Grosso do Sul.
Uma delas, publicada em 20 de fevereiro de 2004 pelo jornal Folha de S. Paulo, cita decreto baixado por José Orcírio dos Santos para regularizar a exploração de caça-níqueis, em seu primeiro ano de mandato à frente do governo estadual.
Mato Grosso do Sul foi citado em entrevista de Carlinhos Cachoeira, preso por corrupção e fraude na loteria carioca. Segundo ele, o Estado arrecadava R$ 130 mil por mês pela exploração de caça-níqueis. A reportagem narra que Jamil Name, “que admitiu ter comandado o jogo do bicho em MS”, tinha concessão até 2006 para administrar as máquinas.
O decreto que regulamentava a vídeoloteria em Mato Grosso do Sul foi revogado no dia 25 de fevereiro de 2004, cinco dias depois da reportagem publicada pela Folha. Após pouco mais de dois anos, em novembro de 2006, o STF julgou o decreto inconstitucional.
Procurado, José Orcírio Miranda dos Santos não atendeu ou retornou as ligações. A reportagem não encontrou Joenildo de Sousa Chaves e João Jazbik Neto.
Omertà – Investigação da Garras (Delegacia Especializada de Repressão a Roubo a Banco, Assalto e Sequestros) e do Gaeco que desencadeou a Operação Omertà aponta que os alvos são integrantes de milícia especializada em execuções de inimigos.
Para os investigadores, são de autoria da milícia as execuções do chefe de segurança da Assembleia Legislativa, Ilson Martins Figueiredo, 62 anos, do ex-segurança do traficante Jorge Rafaat, Orlando Silva Fernandes, o Bomba, de 41 anos, e do estudante Matheus Coutinho Xavier, assassinado por engano no lugar do pai, o policial Paulo Roberto Teixeira Xavier. Os crimes ocorreram entre junho do ano passado e abril deste ano.
As outras mortes listadas são do empresário Marcel Hernandes Colombo, de 31 anos, executado em um bar na Fernando Corrêa da Costa, em outubro do ano passado, e do empresário Cláudio da Silva Simeão, que levou 13 tiros de pistola 9mm, em novembro do ano passado. Na conta do bando, a investigação coloca ainda os assassinatos do delegado Paulo Magalhães em 2013, de Andrey Galileu Cunha em 2012 e do policial Humberto Aparecido Rolon em 2011.
Omertà é um termo napolitano que define um código de honra de organizações mafiosas do sul da Itália.
Mortes encomendadas - Para os investigadores, Jamil Name teria ainda encomendado as execuções do ex-dono do jornal Correio do Estado, Antônio João Hugo Rodrigues, e do delegado Jorge Razanauskas Neto, quando ele ainda era chefe da Polícia Civil em Mato Grosso do Sul.
A informação está em meio ao depoimento do ex-guarda municipal Marcelo Rios ao Garras. Foi a prisão de Rios com um arsenal de guerra, em maio deste ano, que desencadeou a investigação que chegou à família Name. O ex-guarda revelou à polícia que os assassinados só não aconteceram porque os Name se arrependeram que pediram de volta o dinheiro dado para viabilizar os crimes.
Sobre as mortes encomendadas, pelo que consta no inquérito, as apurações não avançaram. Porém, para incrementar os autos dos pedidos de prisão e busca e apreensão, o Gaeco anexa, por exemplo, matéria sobre comentários de Antônio João no Facebook sobre Name.
Nas postagens printadas, o empresário fala sobre a prisão de advogada esposa de juiz, em agosto deste ano, e diz que ela está “enrolada em trambiques que incluem o bicheiro Jamil Name”.
Já a matéria afirma que Antônio João e Name são “rivais antigos” e lembra de suposta surra que o alvo da Operação Omertà teria dado no ex-dono de jornal na década de 1980.
Nesta terça-feira (1º), o empresário que teria sido “jurado de morte” se manifestou, novamente pela rede social, revelando que já sabia da ameaça. “Já tinha sido advertido por amigos de algo de muito grave poderia acontecer comigo, com o comando do Condomínio do Mal. Fiquei sempre atento”.
Antônio João completa o post dizendo que não se espanta “se os assassinos forem soltos logo. “Estarão prontos para matar. Jornalistas, é claro”.
Chefe da polícia - Já Jorge Razanauskas conta que ficou sabendo da suposta encomenda logo após a prisão de Rios, mas duvida que seja verdade. “Eu não acredito nisso, acho que é conversa. Estava muito ligado na época [quando era delegado-geral, de 2008 a 2015]”.
Hoje lotado na Corregedoria do Detran-MS (Departamento de Trânsito de Mato Grosso do Sul), ele diz que durante as investigações sobre a morte do delegado Paulo Magalhães, tratado pelo Gaeco como um dos alvos da milícia armada, a polícia recebia “muita informação, verdadeira e falsa” e afirma que tudo foi investigado. “Na época, a gente investigava tudo. Se naquela época, a gente não recebeu nada, acho muito fantasioso isso”.
Razanauskas diz que nunca se preocupou, nem quando ficou sabendo que foi citado como uma das pessoas com a “cabeça a prêmio” no depoimento do guarda. “Já viu alguma vez pistoleiro devolver dinheiro?”, questiona.