Droga e crime na infância e o pedido de socorro na adolescência
Um garoto com tamanho, rosto, jeito e voz de criança chama a atenção em meio a aula na escola estadual que funciona dentro da Unei (Unidade Educacional de Internação) Dom Bosco. “Quantos anos você tem?”, e a resposta vem tímida: “14”.
Mas logo a aparência infantil entra em contraste com as marcas que ele carrega na vida e no corpo, que já são de adulto.
Com apenas 14 anos – e aparência de 12 – o adolescente cumpre medida socioeducativa há 2 meses por participar de roubo e sequestro, em Campo Grande.
No braço e na perna, traz tatuagens típicas de presidiários, sem cor, vida, e que foram feitas na rua, durante o uso de drogas. Ele é viciado em pasta-base de cocaína e maconha.
Foi ainda na infância, por volta dos 12 anos, que ele conheceu a droga e por meio dela, em uma “rodinha de fumo”, foi apresentado ao crime.
“Um amigo, que usava droga junto, chamou para participar no sequestro”, conta.
O “amigo” é maior de idade, também foi preso, e cumpre pena no Presídio de Segurança Máxima.
Olhando para o chão, o garoto, de cerca de 1,60m, conta que depois que começou a usar drogas “vivia sempre na rua”. Largou a escola na quinta-série e dedicava dia e noite para o vício.
“Mas aprendi a ler e escrever”, garante.
Durante a aula na Unei, o garoto presta atenção no dever que a professora ensina: está aprendendo as letras e nomes dos países e cidades. Começa a se situar no mundo.
Vício – O menino lembra que foi “oficialmente” apresentado às drogas quando estava na escola. “Um grupo me chamou para experimentar”, diz.
Primeiro foi o cigarro, depois a maconha e, então, a cruel pasta-base. Ao falar da escravidão que encontrou nas drogas, o adolescente, sempre olhando para baixo, chora e pede socorro.
“Pedi pra ir para uma clínica”, diz com a voz embrulhada, depois de ensaiar a fala algumas vezes com a voz baixa.
Ele acredita que precisa de tratamento para sair das drogas porque não quer voltar para a rua e o vício, consequentemente.
A decisão sobre qual o tipo de tratamento para a dependência que ele vai receber depende de análise da equipe de saúde da Unidade e do juiz. Apenas em casos considerados extremos de dependência é que o adolescente é mandado para clínica de tratamento, mas o pedido do jovem também é levado em consideração.
As chances de recuperação quando a vontade parte do próprio adolescente é muito maior.
Em outros casos, o dependente pode ser internado por alguns dias só para desintoxicação. Mas para a maioria dos internos o tratamento é apenas ambulatorial, com medicação e acompanhamento médico.
No tempo de internação, o adolescente está longe das drogas e conta que não teve crises de abstinência, mas a preocupação é com a liberdade, o reencontro com os antigos amigos e a família.
“Não quero voltar a usar. Não vou não”, promete.
Família - Na família, ele também já convive com a droga e até com crime. Ele é o segundo a ir para uma Unei. Sua irmã, quando adolescente, já foi detida por tráfico de drogas.
Mas o menino garante que a irmã não usava drogas. “Foi por causa do namorado”, diz.
Já o padrasto, era usuário de droga, mas o adolescente afirma – ou ao menos acredita – que o homem não é mais dependente.
Ele não se sente muito a vontade para falar da relação familiar, mas conta que quer voltar para casa e ajudar a mãe, quer trabalhar.
A mãe é apresentada em uma das suas tatuagens. Ele tatuou o nome dela, Simone, no braço esquerdo. “Ela gostou?”, e ele responde com um sorriso sem graça e sincero: “Não. Não gostou muito não de eu ter feito a tatuagem”.
Na perna, a tatuagem é um sol. Mas o desenho que significa vida e energia não recebeu cor, está esverdeado, como a vida de um garoto que tão cedo foi apresentado ao mundo cinza, sem aproveitar a aquarela da infância.