Um ano após morte de Carla, mãe diz que segue "presa" no último dia com a filha
No dia 3 de julho, o cadáver da jovem apareceu nu, na calçada de um bar na rua onde ela sumiu
“É como se fosse o primeiro dia que ela sumiu, não mudou nada”. Com a sensação de estar presa no dia 30 de junho de 2020, quando ouviu o grito de socorro da filha, Evanir Santana Magalhães, conta que sua vida também parou ali. Hoje (3), completando um ano desde que o corpo de Carla Santana Magalhães, de 25 anos, foi encontrado ao lado da casa em que morava, a mãe relembra sobre os últimos contatos com a filha em detalhes.
O último dia de junho foi a data em que as duas se separaram, mas que segue em um ciclo que não se fecha. Sentada na varanda da casa em que Carla passou os últimos 17 anos de vida, Evanir mantém a voz baixa ao falar sobre a filha enquanto passado, mas retoma o riso trazendo a jovem em memórias que fortalecem o presente.
Sem dar destaque ao 3 de julho, quando o corpo da filha foi encontrado na calçada de um bar, Evanir resume o sentimento em frases concisas. “Faz um ano e para mim é como se fosse ontem. Parece que o tempo continua parado. Acho que do jeito que eu era, nunca mais vou ser. Continua do mesmo jeito, aquela dor”.
Já o dia 30 de junho é retomado em detalhes, cada segundo com a filha viva traz de volta o riso até às 17h daquela tarde. Depois disso, a voz baixa de Evanir retorna e quase some ao narrar a cena de 19h50min, quando a palavra “mãe” saiu da boca de Carla e chegou aos seus ouvidos pela última vez.
Nunca esqueci aquele dia. Levantei primeiro, limpei o quintal e deixei ela dormindo. Coloquei água do mate no fogo e fui para a cama dela e pulei por cima dela. Ela falou assim “como a gente pede socorro se é a própria mãe?”. Aí falei para ela levantar porque a gente ia tomar mate, Evanir relembra.
Revivendo aquela manhã, a mãe conta que as duas tomaram chimarrão e que o almoço foi feito por Carla. Naquele dia, ela relembra que Carla fez batata, bife, arroz e feijão. Acompanhadas da melhor amiga da filha, tomaram tereré pela tarde. “Conversamos, brincamos, eu rindo das duas. Nós três só fazíamos bagunça”. A partir daí, o dia, para Evanir, nunca mais acabou.
“Ela disse que ia comprar café, eu falei que ia tomar banho e depois quando ela voltasse, a gente tomava mais mate. Aí foi a última vez que vi ela”.
Depois disso, Evanir diz que a filha foi até a casa da amiga e, por volta de 19h40min, a mãe passou a estranhar a demora. “Deixei a água no fogo para o mate e resolvi pegar as roupas no varal. Comecei a pegar e umas 19h50min foi a hora que ela me gritou aqui. Ela chegou ali na frente e me gritou”.
Com a calma que não teve no dia, a mãe explica que pegou a chave que estava em cima da mesa, correu e já não encontrou mais a filha. “Mãe, mãe. Socorro. Esse grito, ela me chamando, isso ficou gravado”.
Nem mesmo durante o sono ela consegue escapar e conta que continua sonhando com aquela noite. “Eu durmo, escutava ela gritando. Levantava, sentava na cama e não via nada”.
Esperança por justiça - “Espero que isso mude porque é muito horrível. É esperar ela todo dia para tomar mate, esperar ela para almoçar e não achar minha filha”. Questionada sobre o julgamento de Marcos André Vilalba de Carvalho, de 21 anos, que confessou ter atacado, assassinado e violentado sexualmente Carla, Evanir diz que tem fé.
“Pretendo participar do júri. Eu não sei qual vai ser minha reação quando eu ver ele. Estou me preparando para isso. Espero que ele seja condenado por muito tempo porque não pretendo mais trombar com ele na rua de jeito nenhum”, a mãe explica.
Ainda sobre a esperança por condenação, ela diz que não pensa apenas na justiça pela filha, mas por outras mulheres. “Espero que a justiça seja feita e que ele pague pelo o que fez. Se ele for solto, eu creio que ele não vai parar. O que ele fez com ela, vai fazer com outras”.
Vivendo na mesma casa, a mãe diz que após relembrar tudo, toma forças pensando nas memória da filha deixada em cada canto da casa “Eu tenho minhas lembranças dela aqui. Esse vínculo a gente criou aqui dentro, é o que me dá força para continuar”.
Crime - Carla Santana Magalhães, de 25 anos, desapareceu na noite do dia 30 de junho no Bairro Tiradentes. A família e os vizinhos fizeram uma força-tarefa para encontrá-la, mesmo sem qualquer pista. No dia 3 de julho, o cadáver da jovem apareceu nu, na calçada de um bar na rua onde ela sumiu.
Dia 19 de julho, Marcos foi abordado por policiais do Batalhão de Choque da Polícia Militar, que encontraram vestígios de sangue dentro da quitinete. Responsável pela investigação, a equipe da DEH (Delegacia Especializada de Homicídios) foi ao local e o rapaz acabou sendo preso e confessando, sem dar detalhes.
Foram feitos dois depoimentos na unidade policial para que ele falasse mais claramente. Só em juízo ele admitiu o estupro. Em todo o tempo que foi ouvido, o assassino deu apenas uma suposta motivação: o fato de Carla não tê-lo cumprimentado durante encontro na rua de casa.
Os laudos, no entanto, revelaram um crime violento, com detalhes cruéis. No corpo a perícia encontrou grande corte, além de cinco perfurações do lado esquerdo e uma no direito, no pescoço de Carla, além de sinais de estupro. Crimes por qual Marcos será julgado por júri popular.