Incra mantém parecer que nega controle da Eldorado à Paper Excellence
Órgão cita falta de autorização prévia para controle estrangeiro de terras e sugere distrato amigável
Em uma decisão que reforça a complexidade do processo de aquisição de terras por empresas estrangeiras no Brasil, o presidente do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), César Aldrighi, manteve um parecer técnico que nega à empresa sino-indonésia Paper Excellence o controle da Eldorado Brasil Celulose, instalada Três Lagoas, a 367 quilômetros de Campo Grande.
RESUMO
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O Incra negou novamente a aprovação da compra da Eldorado Brasil Celulose pela empresa sino-indonésia Paper Excellence, reforçando a necessidade de autorização prévia para aquisições de terras por estrangeiros no Brasil. A decisão se baseia na interpretação de que a aquisição das ações da Eldorado, que possui mais de 400 mil hectares de terras, configura a compra indireta de terras e, portanto, exige autorização do Incra e do Congresso Nacional. A Paper Excellence argumenta que a operação se limita à aquisição de um parque industrial, mas o Incra considera as áreas próprias da Eldorado relevantes para enquadrar a aquisição na legislação. A disputa judicial e administrativa segue, com a possibilidade de novos recursos e a continuidade da discussão sobre a validade da transação.
Em decisão publicada no DOU (Diário Oficial da União) desta segunda-feira (4), o órgão sustenta que a compra de parte da Eldorado, realizada em 2017 por cerca de R$ 14 bilhões, deveria ter passado por autorização prévia do Incra e do Congresso Nacional, uma exigência para operações envolvendo vastas extensões de terras por empresas estrangeiras.
O parecer em questão, oriundo da Superintendência Regional do Incra em Mato Grosso do Sul, concluiu que a aquisição das ações da Eldorado pela Paper, uma companhia estrangeira, configuraria a compra indireta de terras — ato que, segundo a legislação brasileira, requer autorização especial. Entre áreas próprias e arrendadas, a Eldorado controla mais de 400 mil hectares de terras no Mato Grosso do Sul, utilizadas no plantio de eucalipto para a produção de celulose. A transferência de controle acionário, segundo o Incra, colocou a empresa sob as regras que regulam aquisições de imóveis rurais por estrangeiros.
A decisão colegiada menciona que a alteração do controle acionário da Eldorado para uma companhia estrangeira implica em um processo que deve ser precedido por aprovação governamental, conforme o Decreto nº 74.965, de 1974. Tal decreto estabelece que as normas sobre aquisição de terras por estrangeiros se aplicam quando a transferência de controle acionário resulta na conversão de uma empresa nacional em uma equiparada à estrangeira.
A controvérsia teve início em 2017, quando a Paper Excellence comprou as ações da J&F, holding dos irmãos Batista, para se tornar controladora da Eldorado. No entanto, a transação logo enfrentou um embate jurídico: um processo de arbitragem favoreceu a Paper, mas a J&F questionou o resultado na Justiça, alegando conflito de interesses.
Com isso, o caso passou a incluir não só aspectos judiciais, mas também administrativos. Em um parecer de 2023, o Incra de Mato Grosso do Sul já havia indicado que a transação não respeitava a legislação vigente. Desde então, a Paper tem apresentado recursos reiterados na tentativa de reverter essa conclusão, todos negados, incluindo o recurso recente submetido em outubro de 2024.
A Paper argumenta que a operação se limitou à aquisição de um parque industrial e que a Eldorado mantém a maior parte de suas operações em regime de arrendamento e parcerias, minimizando a quantidade de terras próprias. No entanto, o Incra manteve sua análise de que as áreas diretamente pertencentes à Eldorado são relevantes para enquadrar a aquisição nos dispositivos legais.
A legislação brasileira é rigorosa em relação à posse de terras por estrangeiros, especialmente em se tratando de extensões significativas que possam ter impactos econômicos e estratégicos. Para o Incra, a não observância desse processo implica na nulidade da transação.
Com a quarta negativa do Incra, a continuidade da disputa deve se intensificar, possivelmente culminando em novos recursos judiciais ou administrativos. Enquanto isso, a recomendação para um distrato amigável entre as partes continua sobre a mesa. A empresa brasileira controlada pelos irmãos Batista já manifestou o interesse de pagar para receber de volta a parte que vendeu, no entanto, a Paper já manifestou desconsideração por essa proposta.