Por interesse pessoal, desembargador é acusado de "graves conflitos" com juízes
Investigação da PF elencou dois "embates" sobre ações da Lama Asfáltica e desmatamento do Parque dos Poderes
Além da PF (Polícia Federal) apurar a venda de sentenças no TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul), a investigação da Operação Ultima Ratio indicou a existência de “graves conflitos” envolvendo o atual presidente da Corte, Sérgio Fernandes Martins e dois juízes da 1ª e 2ª Varas de Direitos Difusos de Campo Grande.
RESUMO
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A Operação Ultima Ratio, que investiga a venda de sentenças no Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS), revelou graves conflitos entre o presidente da Corte, Sérgio Fernandes Martins, e dois juízes. A investigação aponta que a nomeação da juíza Elisabeth Baisch como desembargadora do TJMS, após ela ter proferido uma decisão favorável à construção do novo Palácio da Justiça, mesmo não estando na escala de substituição legal, foi realizada para atender aos interesses de Martins. Além disso, o juiz David de Oliveira Gomes, então titular da 2ª Vara de Direitos Difusos, solicitou remoção após a anulação de três sentenças suas, alegando que os votos de Martins foram ofensivos e que sua decisão em cumprir a reforma da decisão, embora de difícil execução, foi interpretada como “simbiose” com o órgão acusador ou com a defesa de qualquer réu.
Os embates, segundo relatório da PF encaminhado ao STJ (Superior Tribunal de Justiça), teriam ocorrido para “satisfazer os interesses” de Martins.
O conflito mais recente, segundo relatório da PF encaminhado ao STJ (Superior Tribunal de Justiça), aconteceu este ano, envolvendo o juiz da 1ª Vara de Direitos Difusos, Ariovaldo Nantes Corrêa, que barrou desmatamento no Parque dos Poderes.
Em janeiro deste ano, ele entrou de férias, sendo substituído por Elisabeth Rosa Baisch, conforme despacho no dia 8 de janeiro, assinado pelo presidente do TJMS, Sérgio Martins.
Uma semana depois de ocupar a função, em sentença proferida no dia 15, a magistrada autorizou a derrubada de 18 hectares do Parque dos Poderes. A área é solicitada para ampliação de estacionamentos de oito secretarias e construção do novo Palácio da Justiça.
A decisão abriu caminho para homologação de acordo firmado entre MPMS, governo do Estado e Imasul (Instituto de Meio Ambiente de MS), tendo como intervenientes o TJ-MS (Tribunal de Justiça) e a Defensoria Pública, que são detentores das áreas afetadas e reservadas para obras. Em julho, Elisabeth Baisch foi nomeada desembargadora do TJMS.
De acordo com a investigação, a magistrada não estava na escala de substitutos do juiz. Pela normatização interna do Tribunal de Justiça, a escala de substituição automática da 1ª Vara de Direitos Difusos observa a seguinte ordem: 2ª Vara de Direitos Difusos e Coletivos e Individuais Homogêneos, Vara Regional de Falências, Recuperações e de Cartas Precatórias e Vara de Execução Fiscal da Fazenda Pública Municipal. Mas a juíza que decidiu não era titular de nenhuma delas.
“A nosso ver, as circunstâncias em que tal sentença foi proferida fogem à normalidade, resultando em fortes indícios de que tenha ocorrido para satisfazer os interesses de SÉRGIO MARTINS em construir novo prédio do TJMS em troca da promoção da juíza a desembargadora, pois se um processo de tal envergadura nem mesmo estava concluso para sentença, por qual motivo a magistrada teria proferido tal decisão com tamanha velocidade, tendo diversos outros processos nas duas varas pelas quais estava respondendo”, avalia a PF, conforme relatório encaminhado ao STJ.
Decisão - Em maio, o juiz Ariovaldo Nantes Corrêa anula a sentença da substituta, suspendendo a homologação do acordo, alegando justamente a ilegalidade da decisão por magistrada que não estava na escala da substituição legal. O magistrado também encaminhou ao CNJ (Conselho Nacional de Justiça) pedido de apuração da conduta.
Segundo relatório da PF, a PGJ (Procuradoria-Geral da Justiça) recorreu, entrando com agravo de instrumento no TJMS contra anulação da sentença de Elisabeth Baisch. A 2ª Câmara Cível, por maioria, manteve a ordem de Ariovaldo Nantes, proibindo o desmatamento.
Apuração - O pedido de apuração no CNJ foi arquivado. “Da análise dos autos, verifica-se que os fatos, tal como alegados na petição inicial, sem a juntada de provas ou indícios de provas acerca de possível infração funcional praticada, não revelam a prática de ato apto a ensejar a atuação da Corregedoria Nacional de Justiça”. Sobre a escala de substituição legal, o TJMS informou que coube a Elisabeth Baisch a função após série de eventos, como o grande número de magistrados em férias em janeiro, recusa do cargo por um juiz e imprevisto de saúde de outra juíza
“Simbiose” – O outro embate teria ocorrido com o juiz David de Oliveira gomes, então titular da 2ª Vara de Direitos Difusos nos anos de 2021 e 2022 e envolve ação de improbidade administrativa no âmbito da Operação Lama Asfáltica. O problema culminou no pedido de remoção feito pelo magistrado.
O pedido de remoção foi realizado em abril, poucos meses depois que três sentenças de Oliveira foram anuladas em decisões do TJMS, sob alegação principal de “cerceamento de defesa” dos réus da Lama Asfáltica.
Além das anulações, os votos de Sérgio Martins foram considerados ofensivos pelo titular da 2ª Vara de Direitos Difusos.
Em um dos despachos, em que diz que irá cumprir a reforma da decisão, embora de difícil execução, Oliveira lista a sua “defesa” aos ataques. “Fugindo da boa técnica e utilizando-se de ataques pessoais gratuitos, o voto condutor do acórdão documentou neste processo insinuações ofensivas à honra deste magistrado que não podem simplesmente ficar sem um contraponto, pois passariam por verdadeiras, o que definitivamente não o são (...)”, avaliou. “Que fique claro, pois, que o magistrado que assina a presente nunca se permitiu envolver em qualquer tipo de 'simbiose' (seja lá o que isto venha a significar no contexto usado pelo relator) com o órgão acusador ou com a defesa de qualquer réu”, continua o magistrado.
A reportagem não conseguiu contato com o presidente afastado do TJMS, Sérgio Martins, nem com a desembargadora Elisabeth Baisch. O juiz David de Oliveira, hoje na 2ª Vara de Execução de Título Extrajudicial, respondeu que prefere não se pronunciar, e que as decisões têm elementos para se entender o que ocorreu à época.
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