"Brincadeira idiota", justifica réu por morte de jovem com compressor de ar
Thiago Giovani e William Henrique negam versão da denúncia e dizem que não tinham intenção de matar Wesner
“Eu não tinha intenção de matar ele, foi uma brincadeira idiota”, disse, chorando, o autônomo Thiago Giovanni Demarco Sena, 26 anos, ao tentar justificar o que aconteceu em 2017, quando Wesner Moreira da Silva morreu, aos 17 anos. No julgamento realizado hoje pelo crime de homicídio, Sena nega que tenha introduzido a mangueira no ânus do adolescente, como alega a acusação, e que somente encostou o equipamento por cima da roupa.
O julgamento de Sena e William Enrique Larrea, 36 anos, está sendo realizado na 1ª Vara do Tribunal do Júri, em Campo Grande. Os dois foram acusados por homicídio qualificado por dificultar a defesa da vítima.
Thiago foi o primeiro a prestar esclarecimentos no júri popular. Durante esse depoimento ao juiz Carlos Alberto Garcete, o outro réu foi retirado do local.
Thiago Sena contou que era dono do lava a jato localizado na Avenida Ipiranga, na Vila Morumbi, onde o caso aconteceu, no dia 3 de fevereiro de 2017. Contou que Wesner trabalhava no local havia dois meses, indicado por primo. “Sempre foi muito educado, trabalhava muito bem, nunca tivemos desavença, éramos amigos”, contou o réu.
Naquele dia, lembra que tinha acabado de colocar carro na rampa para limpeza e estava na parte debaixo. Diz que viu Wesner passando em frente ao lava a jato e William correndo atrás dele. “Quando saí debaixo do carro, ele veio andando, abraçado com o William”, disse, desmentindo a versão do MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul), que alegava que o adolescente foi carregado.
Thiago também negou que tivesse tirado a bermuda e a cueca do adolescente como consta na denúncia. Diz que William havia relatado que o adolescente usou a mangueira antes, de brincadeira. “Ele [William] estava fazendo xixi e o Wesner pressionou o ar na direção da bunda do William, ele sempre fazia isso”, contou, mas acrescentando que foi em tom de brincadeira.
O réu contou que foi nesse momento que pegou a mangueira de compressão e apertou na direção do adolescente, mas por cima do short. “Aí ele falou, ‘para que tá doendo’, e vomitou”, lembrou. “Puxei a cadeira, ele sentou e dei água; ele levantou a blusa, a barriga dele estava inchada e o William falou ‘acho que entrou ar nele’”. Depois disso, o adolescente vomitou de novo, começou a chorar e falou que estava doendo muito.
Thiago diz que, acompanhado de William, levou o rapaz para o posto de saúde. “Ficamos esperando, o médico saiu e perguntou o que aconteceu. Falei que achava que tinha entrado ar nele, porque fiz uma brincadeira idiota”, lembrou. O médico contou que o adolescente teria que passar por cirurgia e seria transferido.
Thiago disse que foi buscar a mãe de Wesner, Marisilva, e contou o que tinha acontecido. Depois que ela chegou ao hospital e recebeu informações sobre o caso, se revoltou. “Veio para cima de mim com capacete, me esquivei e minha mãe mandou eu ir na delegacia”.
Onze dias depois, Wesner morreu. “Meu mundo já estava desabando, aí, quando ele morreu, acabou”, disse. “Nunca imaginei que pudesse acontecer o que aconteceu, se eu imaginasse, jamais teria brincado com ele”.
Brincadeira também foi a justificativa apresentada pelo outro réu, o autônomo William Enrique Larrea, 36 anos.
William conta que, naquele dia, os três tomaram café juntos no lava a jato. Quando o carro chegou para limpeza, ele jogou água e, depois, foi ao banheiro lavar os braços. Quando estava fazendo xixi, Wesner teria usado a mangueira de compressão nas costas dele. “Ele correu, eu peguei ele e o Thiago ‘bateu o ar’, estava todo mundo rindo e brincando, foi muito rápido”, contou.
William disse que a pistola da mangueira era do tipo borboleta, aberta e não de gatilho, com jato mais forte. “Ninguém segurou ele, Thiago veio e soltou o ar”. Depois disso, o relato dele é semelhante ao do outro réu: lembrou que Wesner disse ter se sentido mal e que a barriga estava doendo e que os dois o levaram ao posto de saúde.
O réu contou que não havia inimizade entre eles. “Não queria maldade com ele, a brincadeira que ele fez comigo foi a mesma, foi tudo muito rápido”.
Segundo o réu, o adolescente tinha condições de se esquivar, dizendo que o espaço era aberto. Também diz que já haviam usado o compressor outras vezes como parte da brincadeira, mas nunca nas costas ou nas nádegas. “Momento algum foi tirado a roupa dele, a gente não sabia nem que ia machucar ele”.
Assim como o outro réu, também pediu perdão. "Perdi várias coisas ali, valores, respeito. Magoei quem eu nunca imaginei magoar, é uma dor grande. Se eles pudessem um dia me perdoar, eu errei, sou humano, falho e eu falhei".
Depois dos depoimentos, o julgamento foi suspenso para almoço. No intervalo, a dona de casa Marisilva Moreira da Silva, 50 anos, mãe de Wesner, disse que não perdoa os réus. "Não aceito não, porque não é verdadeiro", disse. "Agora é tudo ou nada, é choro de pessoas com medo do que vai acontecer na cadeia", avaliou, dizendo que eles se contradizem e que isso deve levar à condenação.
Caso - No detalhamento da denúncia do MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul), consta que tudo começou com uma brincadeira: segundo MPMS, Wesner pediu, em tom de brincadeira, que William comprasse Coca-Cola. “De novo? Agora toda hora é Coca-Cola!, respondeu, pegando pano em seguida para limpar carros e passou a bater na vítima, também de brincadeira.
Em certo momento, Wesner pediu para que o colega parasse, mas não foi atendido. O rapaz correu, mas William foi atrás dele e o imobilizou, agarrando-o pela frente e segurando braços e tórax. Logo em seguida, carregou o adolescente até onde estava Thiago, outro funcionário.
Conforme denúncia, Thiago pegou a mangueira de ar, utilizada para limpeza de carros, retirou a bermuda e a cueca de Wesner, ligou compressor e o introduziu no ânus do adolescente.
O adolescente foi levado para posto de saúde e morreu na Santa Casa, no dia 14 de fevereiro. Laudo pericial atestou que óbito por ruptura espontânea do esôfago, com choque hipovolêmico por hemorragia torácica aguda maciça.