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Cidades

MPMS investiga Conselho Tutelar na morte de menina e convoca pai da vítima

Conselho anexou documentos avaliando que caso era de "acompanhamento temporário", 8 meses antes da morte

Silvia Frias | 04/05/2023 12:19
Trecho de documento elaborado pelo Conselho Tutelar no dia 9 de maio de 2022, após visita na casa da família da menina. (Foto/Reprodução)
Trecho de documento elaborado pelo Conselho Tutelar no dia 9 de maio de 2022, após visita na casa da família da menina. (Foto/Reprodução)

Procedimento administrativo aberto pelo MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) apura possível irregularidade no desempenho do Conselho Tutelar Norte no caso da menina que acabou morrendo, aos 2 anos, 7 meses e 24 dias de idade, vítima de maus-tratos e estupro, em janeiro deste ano. A mãe e o padrasto foram presos e respondem por homicídio triplamente qualificado e estupro de vulnerável.

No procedimento, o Conselho Tutelar Norte anexou os documentos que mostram os atendimentos iniciados em fevereiro de 2022, em que constam como medidas tomadas pelo órgão “orientação, apoio e acompanhamento temporário”.

O pai da menina, o técnico de enfermagem Jean Carlos Ocampos, 28 anos, foi notificado a ir até a 46ª promotoria no dia 8 de maio, para prestar esclarecimentos sobre o atendimento realizado pelos conselheiros tutelares na apuração dos maus-tratos denunciados por ele, desde o ano passado.

Os documentos anexados pelo Conselho Tutelar Norte mostram as idas e vindas de Jean Carlos para apurar o que estava acontecendo com a menina e tentativa de obter a guarda da filha.

No dia 31 de janeiro de 2022, ele registrou boletim de ocorrência na DEPCA (Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente) para que se apurasse possíveis maus-tratos contra a menina àquela época, com 1 ano e meio.

Stephanie e Christian, mãe e padrasto da criança, foram presos no dia 26 de janeiro e foram acusados pela morte. (Foto/Arquivo)
Stephanie e Christian, mãe e padrasto da criança, foram presos no dia 26 de janeiro e foram acusados pela morte. (Foto/Arquivo)

No dia 8 de fevereiro daquele ano, orientado pelo atendimento na DEPCA, procurou o Conselho Tutelar Norte, que atua na região do Jardim Colúmbia, onde a menina morava com a mãe, Stephanie de Jesus da Silva, 24 anos, grávida, o padrasto, Christian Campoçano Leithem, e o irmão de 4 anos.

No relato, Jean Carlos havia percebido hematomas na filha e, ao questionar a ex, as marcas pararam de aparecer. No entanto, a avó materna, Delziene da Silva de Jesus, o procurou e disse que a menina estava sendo maltratada, sendo mal alimentada e morando em local insalubre.

Conforme os documentos, a equipe técnica do setor psicossocial do conselho foi até a casa, sendo atendida por Stephanie. A mulher disse que já os esperava, por conta do desentendimento com a mãe, que não aceitava seu atual relacionamento e “inventava coisas”.

A equipe percebeu acúmulo de louças na pia, roupas para dobrar no quarto onde a menina dormia e constatou atraso no calendário vacinal. Stephanie disse que a filha estava gripada e foi orientada a aguardar a melhora dela para completar a vacinação. Também disse que a criança estava regularmente matriculada e negou acusações.

Relatório do conselho datado em 9 de maio de 2022, 8 meses antes da morte da criança. (Foto/Reprodução)
Relatório do conselho datado em 9 de maio de 2022, 8 meses antes da morte da criança. (Foto/Reprodução)

No relatório, o conselho constatou “que a criança (...) se encontra com seus direitos violados e por isso decidiu aplicar a seguinte medida: orientação, apoio e acompanhamento temporário”.

No dia 10 de maio de 2022, Jean Carlos voltou ao Conselho Tutelar Norte, solicitando documentos dos atendimentos para reivindicar a guarda da filha, seguindo orientação da Defensoria Pública.

O conselho anexou, ainda, relatório de atendimento feito no Cras (Conselho Regional de Assistência Social) do Jardim Vida Nova, em que foram feitas três tentativas de visitas na casa de Stephanie, nos dias 7, 13 e 15 de junho de 2022, mas ninguém foi encontrado.

A documentação anexada pelo conselho pula para 1º de fevereiro de 2023, quando o pai da menina entrou em contato novamente, pedindo cópia dos processos envolvendo a filha no órgão.

Na sequência do histórico, o anexo já trata da morte da menina. É o relatório de atendimento na UPA (Unidade de Pronto Atendimento) da Coronel Antonino descrevendo a chegada da criança, já morta. No corpo, marcas esverdeadas indicando hematomas antigos, barriga inchada, sangramento nasal, além de sinais de violência sexual.

Naquele momento, Stephanie alegou que a filha passou mal no dia anterior, com vômitos e dor na barriga.

A equipe da UPA acionou a PM (Polícia Militar). Os militares entraram em contato com a Polícia Civil e com o Conselho Tutelar Norte. O plantão informou que não iria ao local naquele momento, “pois atribuição cabe à PC” e não teria o que o conselheiro fazer naquele momento.

Posteriormente, ao acessarem os dados, descobriram que a menina tinha ainda dois irmãos: menino de 4 anos e menina de 6 meses de idade. O conselho foi até a unidade de saúde “para aplicar medidas de proteção para os irmãos”.

Em 27 de janeiro, no dia seguinte à morte da menina, o Conselho Tutelar encaminhou à Defensoria Pública a constatação de que a bebê de 6 meses, irmã caçula, “se encontra com seus direitos individuais violados”.

O documento termina informando que é preciso intervenção da Defensoria Pública para que a avó materna possa requerer a guarda. “(...) considerando que a genitora detida sendo suspeita de ter conivência com a morte de sua filha (...) ocorrida no dia 26/01/2023, sendo que o genitor de [caçula] confessou o crime”.

Caso - O atestado de óbito apontou que a menininha sofreu lesão na coluna cervical. Exame necroscópico também mostrou que a criança sofria agressões há algum tempo e tinha ruptura cicatrizada do hímen – sinal de que também já havia sofrido violência sexual.

Stephanie e Christian estão presos pelo crime, denunciados por homicídio triplamente qualificado e estupro de vulnerável. A mãe responde pelo abuso por ter sido conivente com a situação.

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